PODER
JUDICIÁRIO
JUSTIÇA DO
TRABALHO
TRIBUNAL
REGIONAL DO TRABALHO DA 2ª. REGIÃO
1ª. VARA
DO TRABALHO DE SÃO CAETANO DO SUL –SP
Processos
Nº. 1000807-12-2013-5-02-0472 e 1000799-38-2013-5-02-0471 Rito: Ordinário
1ª.
Reclamante: Helenice Macieri Bellaz (proc. 1000807-12-2013-5-02-0472)
2º.
Reclamante Jeanilson Bellaz (proc. 1000807-12-2013-5-02-0472)
3º.
Reclamante: Espólio de João Batista Bellaz (proc. 1000799-38-2013-5-02-0471)
Reclamada:
Saint-Gobain do Brasil Produtos Industriais e para Construção Ltda.
SENTENÇA
EM AÇÃO INDENIZATÓRIA
I -
RELATÓRIO:
Trata-se
de reclamação trabalhista proposta por Helenice Macieri Bellaz e Jeanilson
Bellaz em trâmite nos autos de nº. 1000807-12-2013-5-02-0472, bem como proposta
por Espólio de João Batista Bellaz (proc. 1000799-38-2013-5-02-0471), em
face de Saint-Gobain do Brasil Produtos Industriais e para Construção Ltda.,
em que alegam que seu familiar, Sr. João Batista Bellaz, foi admitido perante a
reclamada em 21.11.1974 e dispensado sem justa causa em 05.02.1990.
Afirmam
que o Sr. João Batista, marido da 1ª. Reclamante e pai do 2º.
Reclamante faleceu em razão de doença profissional adquirida em face da exposição
às fibras de amianto.
Aduzem que
a Reclamada, quando constatada a existência da doença, formalizou acordo
extrajudicial para isenção de obrigações. Entendem pela nulidade da avença, em face
das péssimas condições de saúde do “de cujus” e renúncia de direitos.
Pretendem:
declaração da nulidade do acordo extrajudicial firmado; indenização por danos
morais e materiais experimentados pelo “de cujos” a partir do momento em que
descobriu ser portador do tumor maligno degenerativo denominado “mesotelioma
pleural” até a consumação do de seu óbito, ocorrida em 9.3.2013; reparação dos
danos materiais e morais experimentados pelos reclamantes (viúva e filho do Sr.
João Batista Bellaz) ante o óbito deste último, ocorrido em 9.3.2013; benefício
da justiça gratuita; honorários de sucumbência.
Deram a
cada causa o valor de R$ 40.000,00.
Preliminarmente,
a Reclamada alega a inépcia da inicial, incompetência da Justiça do Trabalho,
ilegitimidade ativa, falta de interesse de agir, eficácia geral do acordo realizado.
Como
prejudicial do mérito argui a prescrição total.
No mérito,
pugna pela improcedência da ação sob o fundamento de validade do acordo
realizado, bem como em razão da ausência de culpa, nexo causal e dano.
Aberta a
audiência inaugural e infrutífera a primeira proposta de conciliação, foi
determinada a realização de prova pericial indireta.
Houve
apresentação de laudo técnico e manifestação das partes.
Aberta a
audiência de instrução, foi ouvido o depoimento pessoal da 1ª. Reclamante.
Sem outras
provas, encerrou-se a instrução processual.
Razões
finais escritas pelas partes.
Infrutífera
a 2ª. proposta de conciliação.
É o Relatório.
II –
FUNDAMENTAÇÃO:
PRELIMINARES
Da
Competência da Justiça do Trabalho
Entende a
Reclamada pela incompetência desta Especializada para julgar a presente, sob
alegação de que a pretensão quanto a indenização por danos morais em nome próprio
da 1ª. e 2º. Reclamante não decorrem da relação de trabalho.
Sem razão.
Compulsando
os autos, evidencia-se que a pretensão da viúva e filho do de cujus decorrem do
óbito deste último, ocorrido em 9.3.2013, em decorrência do tumor maligno
ocupacional, sendo, incontroverso a competência desta Especializada para
processamento e julgamento da demanda, por decorrer da relação de trabalho, nos
exatos termos do art. 114, VI e IX da CF e Súmula 392 do C. TST.
Rejeita-se,
portanto, a preliminar.
Da
Legitimidade Ativa
No que
tange a legitimidade da primeira e segundo Reclamantes, cumpre consignar a análise
em audiência id n. Num. 2593182 - PÁg. 1,
nos autos do processo 1000807.12.2013.5.02.0471, o que ora se ratifica a
legitimidade.
No que
tange a legitimidade do Espólio, rejeita-se, considerando o entendimento deste
Juízo de que embora a violação moral atinja apenas os direitos personalíssimos,
a respectiva indenização patrimonial transmite-se aos sucessores com o
falecimento do titular do direito.
Nesse
sentido a posição dominante do C. TST:
“LEGITIMIDADE
ATIVA DO ESPÓLIO - DANOS MORAIS E MATERIAIS. 1. Consoante a norma inserta no
art. 943 do Código Civil, o direito de exigir reparação e a obrigação de prestá-la transmitem-se com a
herança. 2. Logo, o espólio tem
legitimidade ativa para propor ação
de indenização por danos morais e
materiais, porquanto trata-se de reparação cuja natureza é patrimonial e
decorrente do contrato de trabalho. Isso porque o que se transmite é o direito
de ação e não o direito material em si, este de natureza personalíssima do
empregado falecido. 3. Assim, a decisão regional que considerou o Espólio Autor
parte ilegítima para propor a presente demanda violou o dispositivo legal em
comento. Recurso de revista provido. ( RR - 151000-43.2009.5.08.0015 , Relator
Ministro: Ives Gandra Martins Filho, Data de Julgamento: 29/02/2012, 7ª. Turma, Data de Publicação: 02/03/2012)”
Rejeita-se,
portanto, a preliminar.
Da Inépcia
da Petição Inicial
A
Consolidação das leis Trabalhistas, no art. 840, § 1º, em face o princípio da
informalidade e simplicidade do processo trabalhista, exige do Autor da ação
apenas um breve relato dos fatos e o pedido, sendo certo que tal exigência foi,
satisfatoriamente, cumprida pelos Reclamantes, como se evidencia da petição
inicial.
Ora,
restou incontroverso nos autos que os Reclamantes pretendem indenizações por
danos materiais e morais tanto em decorrência da moléstia profissional
adquirida pelo Reclamante nas dependências da Reclamada e por sua culpa, como
em face da morte do Empregado pela mesma causa de pedir.
Ademais,
restou evidente que a Reclamada conseguiu exercer o contraditório e a ampla
defesa, no particular.
Dessa
forma, rejeita-se a preliminar.
Da Carência
da Ação – Do Interesse Processual
O
interesse de agir depende do binômio necessidade, utilização e adequação.
Como as
demais condições da ação, o interesse de agir deve ser analisado abstratamente
na aferição da viabilidade do pedido submetido ao Judiciário, à vista do que se
alega pela parte interessada.
No caso
dos autos, a pretensão de declaração de nulidade de indenização trabalhista
extrajudicial e a condenação em indenização, demonstram o atendimento ao binômio
necessidade-adequação, pois, a postulação em juízo é o único instrumento pelo
qual o Reclamante pode ver satisfeita a sua pretensão.
Rejeita-se,
portanto, a preliminar.
Da
Eficácia Geral da Quitação do Acordo
A matéria
arguida em sede de preliminar confunde-se com o mérito e com este, será analisada.
PREJUDICIAL
DE MÉRITO
Prescrição
Total
Argui a
Reclamada a prescrição total quanto ao pedido de indenização.
Sem ração
a Reclamada.
Primeiramente
cumpre esclarecer que não há que se cogitar em prescrição eis que o cômputo do
prazo prescricional, em se tratando de doença profissional superveniente a
extinção do contrato de trabalho, inicia-se a partir da ciência inequívoca do
dano.
Neste
exato sentido tem ventilado a jurisprudência do C. TST:
“AGRAVO DE
INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. 1. PRESCRIÇÃO. MARCO INICIAL. CIÊNCIA INEQUÍVOCA
DA LESÃO. A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que a fluência do
prazo prescricional tem início com a ciência inequívoca da lesão, a qual não se
confunde com o simples conhecimento da doença ou com a concessão do primeiro
afastamento previdenciário, já que não evidenciam a certeza e a extensão do
dano. In casu, considerando que a ciência inequívoca da lesão ocorreu em
30/10/2009, conforme registrado no acórdão regional, e a reclamação trabalhista
foi ajuizada em 3/3/2010, não há prescrição a ser pronunciada, sendo
irrelevante a discussão acerca da aplicação do prazo prescricional cível ou
trabalhista. Incólumes, portanto, os arts. 7., XXIX, da CF e 206, § 3º., V, do
CC. 2. REINTEGRAÇÃO. ESTABILIDADE PROVISÓRIA ACIDENTÁRIA (...)
(AIRR -
153-58.2010.5.04.0030 , Relatora Ministra: Dora Maria da Costa, Data de
Julgamento: 26/03/2014, 8ª. Turma, Data de Publicação: DEJT 28/03/2014)”
Assim,
considerando que o falecido somente tomou conhecimento de sua enfermidade em
29.07.2011 conforme documentos médicos carreados nos autos e ação proposta em
25.07.2013, não há que se falar em prescrição.
MÉRITO
Da
Nulidade do Acordo Extrajudicial
Alegam os
Reclamantes que o acordo firmado com a Reclamada é nulo de pleno direito eis
que viola vários institutos legais.
A
Reclamada pugna pela validade do instrumento.
Pois bem.
Capazes as
partes e lícito o objeto, reputa-se válida a transação que alcance direitos
decorrentes de extinto contrato de trabalho, não se podendo ignorar aspecto que
integra o negócio jurídico e que equilibra, por vontade das partes, as concessões
recíprocas.
Entretanto,
o termo de transação que consta nos autos, foi firmado quando o “de cujus”
encontrava-se em estado terminal e em péssimas condições de saúde e sua família
em situação de pleno desespero, não podendo ser avalizado por este órgão.
Atente-se
que em que pese o instrumento de transação esteja datado em março de 2012, os
demais documentos, quais sejam, a Comunicação do Acidente do Trabalho (CAT) ao
INSS e o cheque no valor de R$ 163.207,07, nominal ao “de cujus”, evidenciam a
veracidade do depoimento pessoal da 1 Reclamante de que o instrumento só fora
pactuado em 27.12.2012, as vésperas do falecimento que ocorrera em 09.03.2013,
ratificando, repita-se, a tese quanto a aceitação do pacto em face do gravíssimo
estado de saúde e debilidade do antigo Empregado.
Ora,
conferir ao ex-trabalhador suposto termos de concessões mútuas as vésperas de
seu falecimento causado por culpa da Empresa, com cláusulas que evidenciam a expressa
renúncia irrevogável de direitos indisponíveis, não pode ser acolhido por este Juízo,
por atentar contra boa fé e lisura contratual e ir de encontro com equilíbrio das
relações contratuais.
Cumpre
consignar ainda que a Reclamada, no intuito de mascarar a lisura do pacto,
tenta induzir o leigo a erro quanto viabiliza a possibilidade do “EXAMINANDO” discutir
as cláusulas e classificações da doença, sem o possibilitar, no entanto,
qualquer represália ou intenção de ordem patrimonial.
Mais uma
vez surpreende-se o Juízo com a má-fé contratual da Reclamada em levar o
“EXAMINANDO” a erro, que diante da situação que se encontrava foi “obrigado”, à
beira da morte a assinatura do pacto.
Assim, a
evidencia do desequilíbrio da avença e conduta que beira ao abuso de direito,
entende-se, nos termos do art. 9. da CLT, nulo de pleno direito os termos da avença
no que tange a renúncia de direitos trabalhistas, entendendo-se, no entanto,
que eventual valor conferido na presente, a título de indenização, poderá ser compensado
com o valor comprovadamente recebido pelo “de cujus”, quando da assinatura da avença.
Do
Amianto/ Da Doença Ocupacional
Alega os
Reclamantes que o “de cujus” laborou para a Reclamada no período de 21.11.1974
a 05.02.1990, sempre exposto, de forma contínua à poeira do mineral notoriamente
cancerígeno denominado “amianto” ou “asbesto” em sua antiga unidade fabril
localizada no município de São Caetano do Sul-SP.
Em defesa,
a Reclamada sustenta, em síntese, que não pode ser responsabilizada pela
patologia noticiada, eis que a responsabilidade pela ocorrência de doença profissional
é subjetiva e as práticas do processo produtivo sempre pautaram pela garantia
de ambiente seguro e saudável nas suas instalações.
De plano,
cumpre consignar que em face de diversos estudos técnicos realizados, inclusive
acostados nos presentes autos, a exposição do ser humano às fibras de amianto ocasionam
sérios problemas de saúde. Atente-se que as ocorrências ficam embutidas no
organismo e quando aparecem evidenciam a gravidade da lesão e intensidade da insalubridade
do agente.
Registra-se
ainda, por amor a repetição, que como de notório conhecimento, a utilização do
mineral fora proibida em diversos países e em algumas cidades do Brasil, tendo,
atualmente, diversas discussões sobre a possibilidade de banimento do produto,
em face, repita-se, dos conhecidos prejuízos à saúde do ser humano.
Analisando
toda documentação acostada aos autos percebe-se que o “de cujus” em 29.7.2011
foi diagnosticado pelo Serviço de Anatomia Patológica do Hospital do Servidor Público
Estadual com “mesotelioma epitelial”, vindo tal resultado a ser confirmado em
nova biópsia concluída em 8.8.2011 (laudo em anexo) e em exame realizado pelo serviço
de pneumologia da FUNDACENTRO em 29.9.2011 (em anexo).
Atente-se
que os referidos documentos em conjunto com exames do falecido foram analisados
pela Sra. Perita que concluiu de forma extremamente técnica e elucidativa que
havia nexo causal direto do mesotelioma epitelial com o trabalho do “de cujus”,
em face da sua exposição ao agente “amianto”.
Atente-se
que a Sra. Perita foi esclarecedora, inclusive, quanto à ausência de
fornecimento adequado de Equipamentos de Segurança, caindo por terra a frágil alegação
da Reclamada quanto à preservação da saúde do trabalhador.
Ora,
incontroverso a existência de doença ocupacional, que ocasionou a morte do ex-funcionário
(causa mortis), resta evidente a ocorrência do dano - morte da vítima-, e; o
nexo causal direto, já que o dano decorreu em razão da exposição do empregado
ao mineral altamente prejudicial à saúde (causa) e a doença (efeito), art. 19
da Lei 8.213/91.
Entretanto,
por amor ao debate e, em face da alegação da Reclamada quanto à necessidade de análise
da culpa, para aferir a sua responsabilidade (o que não se aplicaria, no caso concreto,
por entender este Juízo que a Empresa possui evidente responsabilidade
objetiva, em face do notório conhecimento quanto à natureza insalubre do mineral),
passa-se a analisar o conjunto probatório para aferir se a Empresa desincumbiu
do ônus de comprovar a inexistência da sua culpa, e, por via de consequência, a
exoneração da responsabilidade civil.
De plano,
registra-se o cabimento quanto à análise do respeito por parte da Reclamada das
normas de segurança e saúde.
Ora, o ônus
da prova cabe à Empresa, sendo interessante transcrever o entendimento do C.
TST:
“Indenização
por danos morais – acidente de trabalho. Na apuração da responsabilidade civil
em decorrência do acidente do trabalho, o ônus da prova recai sobre o
empregador, que deve comprovar a inexistência da conduta culposa. Entretanto, não
se desonerando do encargo que milita em seu desfavor, presume-se a culpa, surgindo
o consequente dever de indenizar o trabalhador pelo prejuízo sofrido. TST.
3ª. Turma. RR. 84.813/2003-900-03-00.2, Rel.: Ministra Maria Cristina Irigoyen Peduzzi,
DJ 15set. 2006.”
A Constituição
Federal de 1988 conferiu a toda a sociedade a garantia da vida e da integridade
física e psíquica.
Nesse
sentido, os artigos 225, 200, VIII, e 7º., XXII, da CF garantiram aos
trabalhadores o direito de exercerem as suas atividades num ambiente de
trabalho equilibrado e essencial à sadia qualidade de vida, e; a
obrigatoriedade dos empregadores de reduzir os riscos inerentes ao trabalho, através
de normas de saúde, higiene e segurança.
Assim,
deve a empresa instruir os empregados, através de ordens de serviços, quanto às
precauções a tomar no sentido de evitar acidentes de trabalho nos termos do
art. 157, II da CLT, bem como proporcionar treino, orientação e preparo para o
desempenho das atividades.
Consigne-se
que não basta à empresa fornecer orientações e equipamentos de individuais e
coletivos de segurança, o art. 157, I da Consolidação das Leis Trabalhistas determina
que cabe às empresas cumprir e fazer cumprir as normas legais de segurança e
medicina do trabalho.
Deixando
de agir em conformidade com as normas legais que objetivem eliminar ou diminuir
os riscos do ambiente laboral, e até mesmo se omitindo, por dolo ou culpa, na fiscalização,
prevenção e exigência de cumprimento da legalidade, o ente empresarial comete
ato ilícito, passível de responsabilidade.
Registre-se
que a responsabilização do empregador não decorre do perigo da atividade
exercida pelo obreiro, mas sim do seu descumprimento de normas de segurança e/ou
falta de fiscalização ao meio ambiente de trabalho.
Nesse
sentido, pode-se dizer que a culpa do ente empresarial reside na inobservância
do dever de cautela, ou culpa contra a legalidade.
Importante
observar as lições do Excelentíssimo, Sebastião Geraldo de Oliveira1:
A simples violação
de uma dessas normas, havendo dano e nexo causal, cria a presunção de culpa do
empregador pelo acidente do trabalho ocorrido, uma vez que o descumprimento da
conduta normativa prescrita já é confirmação de sua negligencia, a ilicitude
objetiva ou culpa contra a legalidade.
No caso
dos autos, restou evidenciado que durante mais de 15 (quinze) anos o “de
cujus”, ficou exposto às fibras de amianto, sem a devida proteção.
Atente-se
que a classificação do amianto a que ficou exposto o ex-empregado não impediu o
aparecimento da doença, ao contrário, diversos estudos apontaram que o mineral é
tão devastador que o mínimo de exposição acarretam a doença.
Ademais,
repita-se a Reclamada, diferentemente do alegado em defesa não comprova ações
minimizadoras e preventivas da exposição do ex- empregado ao “asbesto”.
Assim,
evidenciada a ausência de provas quanto à diligência necessária para exoneração
da responsabilidade, cabível a responsabilidade da Reclamada.
Do Dano
Material - Pensão
Nos termos
do art. 948 do Código Civil, cabe a indenização por danos materiais, na forma
de pensão, às pessoas a quem o morto os devia.
Sabendo
que a natureza jurídica da pensão decorrente de ato ilícito possui o objetivo
de reparar o prejuízo da perda da renda familiar, e, verificando que a
Requerente dependia economicamente da vítima, eis que era esposa do falecido e
dependente legal conforme faz prova o documento previdenciário anexado aos
autos, defere-se o pedido de indenização desde a data do óbito na forma de pensão
fixada em 2/3 dos rendimentos recebidos pela vítima, nos termos das variações
salariais da sua categoria profissional presumindo-se que 1/3 representava as
despesas pessoais da vítima. Tudo, nos termos da jurisprudência do STJ:
“RESPONSABILIDADE CIVIL.
MORTE DA ESPOSA. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA DO MARIDO. VALORAÇÃO DA PENA. PRESUNÇÃO
LEGAL. CC, ART. 231-III. PROVA DA DEPENDÊNCIA. DESNECESSIDADE. PRECEDENTES. PROCEDÊNCIA
DO PEDIDO. APLICAÇÃO DO DIREITO À ESPÉCIE. RISTJ, ART. 257. DEDUÇÃO DE 1/3(UM
TERÇO) DA PENSÃO. GASTOS PRÓPRIOS DA VÍTIMA. (…)
I - É comum nas famílias de baixa
renda haver dependência econômica entre os cônjuges, notadamente em razão de
ser sobremaneira difícil a sobrevivência da família com o salário de apenas um
deles, sendo certo, ademais, que a assistência econômica prestada por um dos cônjuges
ao outro goza de presunção legal de existência (art. 231, III, CC).
II - Segundo a boa doutrina,
"os danos materiais e morais causados aos parentes mais próximos não
precisam de prova, porque a presunção é no sentido de que sofrem prejuízos com
a morte do parente".
III - Os alimentos a que se
refere o art. 1537-II, CC, não se identificam com os previstos no Direito de Família.
IV - Afigura-se razoável e justo
fixar a indenização em 2/3(dois terços) da renda da vítima, deduzindo um terço
(1/3) correspondente ao que essa, por presunção, despenderia com seu próprio
sustento.
(…)
(REsp 157.912/RJ, Rel. Ministro SÁLVIO
DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, julgado em 04/08/1998, DJ 21/09/1998, p.188)
Ressalta
este Juízo que, em face da natureza ressarcitória do instituto, para o cálculo
da indenização também deverão ser incluídas o valor relativo ao 13º. salário
pelo seu duodécimo mais o acréscimo de 1/3 sobre o direito às férias de todo o período
concedido, com o intuito de retratar a fidelidade dos possíveis ganhos que
efetivamente a vítima aferiria, evitando-se o enriquecimento sem causa da
empresa.
Para o cálculo
do período da pensão deverá ser levado em consideração a idade em que a vítima
tinha na data do falecimento menos a expectativa de vida prevista pelo IBGE
para atingir a diferença de anos devida pela indenização.
Defere-se
ainda o pagamento da indenização de uma só vez, nos termos do artigo 950 do Código
Civil.
Esclareça-se,
por ser oportuno, que este Juízo comunga do entendimento preconizado na súmula
229 do C. STF, sendo que o recebimento de benefício previdenciário não obsta o
recebimento quanto a indenização de natureza civilista.
Da Indenização
por Dano Moral
A questão
do dano moral tem assumido relevância no âmbito do Direito do Trabalho diante
da elevação da dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho ao
patamar dos fundamentos do "Estado Democrático de Direito" (art. 1º.,
incisos III e IV), acrescentando que "são invioláveis a
intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o
direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação"
(art. 5º., inciso X).
Dessa
forma, comprovada existência da doença ocupacional e a culpa da Reclamada, o
dano moral é presumido.
Isso
porque, este Juízo filia-se à corrente que defende que tal dano existe in re
ipsa, cuja prova se dispensa dada a sua impossibilidade de concreção,
bastando, para tanto, a comprovação do ato ilícito (art. 186 c/c art. 189,
ambos do CC/02).
A corrente
ora defendida entende que a configuração do dano moral não depende de prova da
dor, do sofrimento para que se configure a obrigação de indenizar.
No dizer
de Sérgio Cavalieri Filho 2: “o dano moral existe in re ipsa; deriva inexoravelmente
do próprio fato ofensivo, de tal modo que, provada a ofensa, ipso facto,
está demonstrado o dano moral à guisa de uma presunção natural, uma presunção hominis
ou facti, que decorre das regras da experiência comum”
O ato ilícito
da Reclamada ficou demonstrado no tópico anterior, diante da negligência quanto
à segurança e saúde do ex-empregado.
Ademais, a
perda da saúde com a consequente impossibilidade de recuperação, como é o caso
dos autos, afeta o ser humano e a família em seu patrimônio ideal, causando-lhe
prejuízos naquilo que tem de mais precioso, sua saúde e a perda do ente
querido.
Fixação do
quantum:
A fixação
do quantum relativo ao dano moral proveniente do acidente de trabalho deve
observar, primordialmente, a extensão do dano e a situação fática vivenciada
pelas partes, assim como a capacidade econômica da reclamada e o caráter pedagógico
da medida, de modo a prevenir a ocorrência de futuros casos de lesão.
Nesse
sentido, considerando a morte da vítima e sabendo que a Reclamada possui
capacidade econômica para arcar com as indenizações decorrente de sua negligência
em face de falta de fiscalização do ambiente de trabalho e, ainda com o com o
intuito de alertar o infrator para as consequências do desrespeito às regras de
segurança e saúde do trabalho, defere-se, a indenização no montante de
R$500.00,00 ao espólio, R$500,00 a Primeira Reclamante (viúva do “de cujus”) e
R$ 500.000,00 ao Segundo
Reclamante
(filho do “de cujos”), os dois últimos em face do dano em “ricochete”.
Dos Honorários
Periciais
Diante da
sucumbência na pretensão relativamente objeto da perícia realizada nos autos,
condena-se a Reclamada ao pagamento de honorários periciais (CLT, 790-B), cujo
valor fixo em R$ 2.500,00.
O valor
dos honorários periciais deverá ser atualizado monetariamente até a data do
efetivo pagamento de acordo com o art. 1º. da Lei n. 6.899/1981, sobre ele
incidindo juros de mora igual ao dos créditos trabalhistas.
Dos Honorários
Advocatícios
Improcede,
pois não preenchidos os requisitos da Lei 5584/70, inteligência das Súmulas 219
e 329 do TST.
Improcede
ainda, nos termos da súmula 18 do E. TRT da 2ª. Região.
Do Benefício
da Justiça Gratuita
Tendo sido
preenchidos os requisitos delineados no artigo 790, § 3º., da CLT, defere-se o
benefício da justiça gratuita aos Autores.
Das
Contribuições Previdenciárias e Fiscais
No caso
dos autos, havendo condenação meramente em indenização por danos morais e
materiais, entende-se como hipótese de não-incidência tributária.
Dos Juros
e da Correção Monetária – Danos Morais e Materiais
Para a indenização
por dano material, o termo inicial da correção monetária é a data do
conhecimento do evento danoso, qual seja, 29.07.2011, data do conhecimento da doença.
Os juros e
correção monetária referentes à indenização por danos morais deverão observar
os critérios elencados na Súmula 439, do C. TST.
III –
DISPOSITIVO
Pelo exposto
e tudo o mais que dos autos consta, a 1ª.
Vara do Trabalho de São Caetano do Sul REJEITA AS PRELIMINARES E
PREJUDICIAL DE MÉRITO e JULGA PARCIALMENTE PROCEDENTE os pedidos
constantes na reclamatória trabalhista ajuizada por Helenice Macieri Bellaz,
Jeanilson Bellaz e Espólio de João Batista Bellaz, para condenar a
reclamada Saint-Gobain do Brasil Produtos Industriais e para Construção Ltda. ao pagamento das seguintes verbas:
1) pensão
mensal vitalícia em favor da Reclamante Helenice Macieri Bellaz no
montante de dois terços (2/3) dos rendimentos recebidos pela vítima, corrigidos
nos termos das variações salariais da sua categoria profissional, ressaltando
que em face da natureza ressarcitória do instituto, para o cálculo da indenização
também deverão ser incluídas o valor relativo ao 13º. salário pelo seu duodécimo,
mais o acréscimo de 1/3 sobre o direito às férias de todo o período concedido,
com o intuito de retratar a fidelidade dos ganhos que efetivamente a vítima
aferia, evitando-se o enriquecimento sem causa da Empresa.
Para o cálculo
do período da pensão deverá ser levado em consideração a idade em que a vítima
tinha na data do falecimento menos a expectativa de vida prevista pelo IBGE,
para atingir a diferença de anos devidos pela indenização.
Defere-se
ainda o pagamento da indenização de uma só vez, nos termos do art. 950 do CC,
improcedendo, portanto, a constituição de capital, nos termos do artigo 475-Q, § 1º., do
CPC.
2) indenização
por danos morais no montante de R$500.00,00 ao espólio, R$500,00 a Primeira
Reclamante (viúva do “de cujus”) e R$ 500.000,00 ao Segundo Reclamante (filho
do “de cujos”), os dois últimos em face do dano em “ricochete”, totalizando o
montante de R$ 1.500.000,00.
Autoriza-se
a compensação do valor percebido no instrumento particular de transação.
Não haverá
incidência de contribuições previdenciárias e fiscais sobre os danos materiais
e morais, ora deferidos, em razão da natureza indenizatória das verbas.
Os honorários
periciais deverão ser arcados pela Reclamada, parte sucumbente no objeto da
perícia, no montante de R$ 2.500,00.
O valor
dos honorários periciais deverá ser atualizado monetariamente até a data do
efetivo pagamento de acordo com o art. 1º. da Lei n. 6.899/1981, sobre ele
incidindo juros de mora igual ao dos créditos trabalhistas.
Para a indenização
por dano material, o termo inicial da correção monetária é a data do
conhecimento do evento danoso, qual seja, 29.07.2011, data do conhecimento da doença.
Os juros e
correção monetária referentes à indenização por danos morais deverão observar
os critérios elencados na Súmula 439, do C. TST.
Defere-se
o pedido de Justiça Gratuita.
Improcedem
os demais pleitos.
Tudo nos
termos da fundamentação, que integra o presente dispositivo.
Remeta-se
a cópia desta à Procuradoria da Fazenda Nacional, nos termos da Recomendação
conjunta GP.CGJT 02/2001.
Expeça-se
ofício à DRT.
Custas
pela Reclamada, calculadas sobre o valor atribuído à condenação de R$
2.000.000,00, no importe de R$ 40.000,00.
Intime-se
as partes.
TARCILA DE
SÁ SEPÚLVEDA ARAÚJO
Juíza do
Trabalho Substituta
1 OLIVEIRA,
Sebastião Geraldo de. Indenizações por Acidente de Trabalho, ou Doença
Ocupacional. Editora LTR, 2008, p.g 161.
2 CAVALIERI
FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 2. ed. São Paulo: Malheiros,
2000.
Assinado
eletronicamente. A Certificação Digital pertence a:
[TARCILA
DE SA SEPULVEDA ARAUJO]
http://pje.trtsp.jus.br/primeirograu/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam
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