PROCESSO Nº TST-RR-92840-68.2007.5.02.0045 C/J PROC. Nº TST-AIRR-92841-53.2007.5.02.0045
A C Ó R D Ã O
(6ª Turma)
GMACC/mda/afs/m
AGRAVO DE INSTRUMENTO. DANO MORAL. CONTATO COM ASBESTO. DOENÇA OCUPACIONAL. MESOTELIOMA. MORTE DA VÍTIMA. QUANTUM INDENIZATÓRIO. Viável o provimento do agravo de instrumento ante a possível violação do artigo 5º, V, da Constituição Federal. Agravo de instrumento provido.
RECURSO DE REVISTA. PRELIMINAR DE NULIDADE DO ACÓRDÃO REGIONAL POR NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. Preliminar não examinada com fulcro no artigo 249, § 2º, do CPC.
DANO MORAL. CONTATO COM ASBESTO. DOENÇA OCUPACIONAL. MESOTELIOMA. MORTE DA VÍTIMA. QUANTUM INDENIZATÓRIO. Incontroverso nos autos o diagnóstico de mesotelioma pleural, assim como o nexo de causalidade entre a doença e o produto utilizado na empresa (asbesto), de forma que não se está a discutir aqui a caracterização como doença ocupacional, mas tão somente o valor fixado para a indenização por danos morais frente a esse quadro. Impressiona à consciência social, e circunstancialmente à do julgador, o aspecto de o dano a ser reparado estar relacionado não apenas com a atividade de risco pontual, inerente a funções topicamente exercidas por empregado em dada empresa, mas de morte e expiação de trabalhador envolvido em atividade econômica dirigida, em seu núcleo e possíveis projeções, à exploração de fibra mineral cuja inalação é, hoje, reconhecidamente letal. Cogita-se, portanto e na ação lesiva, o desapreço à vida e ao projeto humano e transgeracional, universal e fls.2 PROCESSO Nº TST-RR-92840-68.2007.5.02.0045 C/J PROC. Nº TST-AIRR-92841-53.2007.5.02.0045
essencialmente jurídico de um meio ambiente ecologicamente equilibrado (artigo 225 da Constituição Federal), inclusive no que toca ao meio ambiente do trabalho (artigo 200, VIII, da Constituição Federal). A dignidade humana compreendida constitucionalmente está fundamentalmente correlata com a atividade econômica e sua respectiva função social (artigos 1º, 3º, 170 e 225 da Constituição Federal). Não é desconhecido o desassossego causado pelo processo dos produtos de amianto, sabidamente banido em vários países da comunidade internacional e atualmente objeto da ADI 4.066 perante o Supremo Tribunal Federal, direcionada ao artigo 2º da Lei nº 9.055/1995, que permite a exploração comercial e industrial do amianto branco (crisotila). Tem-se, no caso, caracterizada uma doença ocupacional letal (mesotelioma) relacionada diretamente ao ramo de atividade empresarial da reclamada, configurando indelevelmente o dano sujeito à reparação por quem o causou. Reparação essa que deve se revestir de caráter compensatório, punitivo e pedagógico envolvida na responsabilidade do ofensor em toda sua extensão, sem olvidar qualquer dos valores jurídicos acintosamente desdenhados pela ação empresarial que proporcionou ao empregado o sofrimento e a morte. No arbitramento da indenização correspondente, contudo, o julgador deve ter em mira as partes envolvidas na lide, o dano ocorrido e os seus efeitos. Compete, ainda, ao juiz arbitrar quantia suficiente para reparar o sofrimento do ofendido, sem concorrer para o seu enriquecimento sem causa ou para o empobrecimento do ofensor. Pode-se dizer que a impossibilidade de retorno ao status fls.3 PROCESSO Nº TST-RR-92840-68.2007.5.02.0045 C/J PROC. Nº TST-AIRR-92841-53.2007.5.02.0045
quo ante em razão do evento morte ocasionado pela doença ambiental e ocupacional esvazia quase por completo a função compensatória da pena, não fosse, ante a inexorável irreversibilidade do dano, a transmissão da pretensão reparatória aos seus sucessores. A seu turno, o caráter punitivo se encontra alcançado pela fixação da indenização que atinge a função de reprimenda. E é, por fim, na função pedagógica da sanção, quando se busca desestimular a conduta danosa praticada pelo ofensor, que se deve deter especial atenção. Na questão da qual ora se trata, doença pulmonar pela inalação de poeira tóxica provocada em função do ramo de atividade da reclamada, não há como se furtar ao interesse da humanidade, aí considerado em sua essência o cidadão, como tal e na qualidade de trabalhador, na prevenção e desestímulo da conduta danosa verificada. Faz-se necessário aqui ponderar que a efetiva constatação do mesotelioma no antigo colaborador sobreleva qualquer alegação de adoção de medidas preventivas, como uso de EPIs, e de observância dos limites da lei, segundo o modelo exegético de conveniência, para o processo do produto de amianto. Recurso de revista conhecido e provido para elevar o valor da indenização a R$ 1.000.000,00.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR-92840-68.2007.5.02.0045, em que é Recorrente ESPÓLIO DE YURA ZOUDINE e Recorrida ETERNIT S.A.
Trata-se de agravo de instrumento interposto contra decisão mediante a qual se denegou seguimento ao recurso de revista. fls.4 PROCESSO Nº TST-RR-92840-68.2007.5.02.0045 C/J PROC. Nº TST-AIRR-92841-53.2007.5.02.0045
Procura-se demonstrar a satisfação dos pressupostos para o processamento do recurso obstado.
Contraminuta ao agravo de instrumento e contrarrazões ao recurso de revista foram apresentadas às fls. 655-673 e 679-761 (doc. seq. 01).
Os autos não foram enviados ao Ministério Público do Trabalho, por força do artigo 83, § 2º, do Regimento Interno do Tribunal Superior do Trabalho.
É o relatório.
V O T O
1 – CONHECIMENTO
O agravo de instrumento é tempestivo, está subscrito por advogado habilitado nos autos, bem como apresenta regularidade de traslado.
Conheço.
2 – MÉRITO
DANO MORAL. DOENÇA OCUPACIONAL. MESOTELIOMA. CONTATO COM ASBESTO. MORTE DA VÍTIMA. QUANTUM INDENIZATÓRIO.
O Tribunal Regional, ao apreciar recurso ordinário interposto pela reclamada, assim decidiu quanto à configuração do dano moral:
"A recorrente pugna pela reforma. Aduz, para essa finalidade, que os três requisitos básicos e fundamentais para a pretensão indenizatória não estão satisfeitos.
Afirma que a responsabilidade do empregador é subjetiva, subordinada sempre à comprovação do dolo ou culpa. fls.5 PROCESSO Nº TST-RR-92840-68.2007.5.02.0045 C/J PROC. Nº TST-AIRR-92841-53.2007.5.02.0045
Assegura que a Constituição é que limita, de forma clara, o âmbito da responsabilidade do empregador, pelo que é inquestionável que o fato de uma lei ordinária, tal como o Código Civil, instituir o dever de indenizar para as genéricas hipóteses de risco não é suficiente par tornar objetiva a responsabilidade do empregador nestas situações. Transcreve doutrina e jurisprudência que entende abonar a argumentação e, consequentemente, a pretensão.
Menciona o fato de o de cujus ter prestado serviços há quarenta anos e a impossibilidade de realização de perícia no local de trabalho, assim como a NR nº 6 e o sistema de proteção coletiva que adotara. Indica violação do art. 5º, inciso II, da Constituição Federal.
Mantenho.
O julgado encontra apoio no art. 927, parágrafo único, do Código Civil. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos caos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
A r. sentença encontra amparo e esteio ainda a causa da doença (uso de asbesto e exposição do de cujus aos efeitos respectivos). Os considerandos que constam da Lei 12684/2007, do Estado de São Paulo, transcritos na fundamentação (fls. 477 e seguintes) são aqui, expressamente, adotados, per relationem.
A impossibilidade de realização de perícia, em face da não existência do local de trabalho tampouco é impedimento ao reconhecimento do direito pleiteado.
Há uniformização da jurisprudência sobre o tema. A Orientação Jurisprudencial nº 278 estabelece o seguinte:
Adicional de insalubridade Perícia Local de trabalho desativado. A realização de perícia é obrigatória para a verificação de insalubridade. Quando não for possível sua realização, como em caso de fechamento da empresa, poderá o julgado utilizar-se de outros meios de prova.
Na realidade, não houve previsão do legislador consolidado, quanto à hipótese de impossibilidade de elaboração do laudo, seja pela desativação do fls.6 PROCESSO Nº TST-RR-92840-68.2007.5.02.0045 C/J PROC. Nº TST-AIRR-92841-53.2007.5.02.0045
local onde anteriormente trabalhara o ex-empregado seja pela extinção do estabelecimento ou seja por outra circunstância qualquer.
A Consolidação das Leis do Trabalho limita-se a afirmar (art. 195) que a caracterização e a classificação de insalubridade e da periculosidade, segundo as normas do Ministério do Trabalho, far-se-ão através de perícia a cargo de Médico do Trabalho ou Engenheiro do Trabalho, registrado no Ministério do Trabalho.
Sucede que ‘... o juiz não se exime de sentenciar ou despachar alegando lacuna ou obscuridade. No julgamento da lide caber-lhe-á aplicar as normas legais; não as havendo, recorrerá à analogia, aos costumes e aos princípios gerais de direito’ (art. 126 do Código de Processo Civil).
Assim, é lícito e imperioso o recurso aos dispositivos do Estatuto Processual comum. Sobretudo porque essa remessa é feita pela própria Consolidação (art. 769) que considera a Lei de Ritos fonte subsidiária do processo do trabalho (Nos casos omissos, o direito processual comum será fonte subsidiária do direito processual do trabalho, exceto naquilo em que for incompatível com as normas deste Título).
E o Código de Processo Civil afirma (art. 427) que: ‘... O juiz poderá dispensar prova pericial quando as partes, na inicial e na contestação, apresentarem sobre as questões de fato pareceres técnicos ou documentos elucidativos que considerar suficientes’ (redação da Lei 8.455/92).
No caso, a eclosão do evento danoso, que resultou na morte do de cujus, é mais que evidente quanto à causa, independentemente, ou não, de fornecimento de equipamento de proteção individual ou de outras medidas, não especificadas, para proteção no ambiente de trabalho.
Resta íntegro ainda o princípio da reserva legal (art. 5º, inciso II, da Constituição Federal). Precedentes: TRT/SP 01055.2002.262.02.00-9; TRT/SP 01295.2006.431.02-0; TRT/SP 045.2003.402.02.0.
O fato de ocorrer interpretação dos dispositivos em causa não resulta em violação literal de disposição de lei federal ou afronta direta e literal à Constituição Federal. Tampouco interpretação diversa de Orientação Jurisprudencial ou Súmula. fls.7 PROCESSO Nº TST-RR-92840-68.2007.5.02.0045 C/J PROC. Nº TST-AIRR-92841-53.2007.5.02.0045
Tanto assim o é que, na forma do art. 5º da Lei de Introdução ao Código Civil, ‘... na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum’.
Para Maria Helena Diniz (‘Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro Interpretada’, Editora Saraiva, São Paulo, 1994, pág. 171): ‘... O magistrado deverá determinar o direito que há de valer no caso sub judice, devendo para tanto apurar existência da norma, determinando seu sentido, e decidir se a lei é aplicável, ou não, ao caso. (...) Decide dentro da moldura legal, mediante uma valoração objetiva. Se a interpretação não comportasse tal elasticidade, se fosse ‘rígida’, a ordem jurídica amputar-se-ia em seu próprio movimento, não poderia realizar-se, por não estar aparelhada para sofrer o impacto da realidade. Daí as sábias palavras de Engish de que ‘normatividade carece de preenchimento valorativo’.
Exatamente nesse sentido, há numerosas manifestações. Entre os r. arestos, vale indicar, exemplificativamente, o seguinte:
(...)
Por derradeiro: No nosso ordenamento jurídico, as decisões judiciais são proferidas à base da lei, mas na técnica da aplicação desta está sempre embutido o propósito de uma solução justa; as regras de hermenêutica têm sempre esse sentido, orientando o intérprete, pelo menos, a resultados razoáveis (Proc. STF - Embargos de divergência no REsp nº78301/BA, Relator Ministro Ari Pargendler, DJU. nº 163, 26 de agosto de 1998, Seção I, pág. 95.
6 – Dano moral - A recorrente afirma que não praticou qualquer ato que tenha ferido os valores íntimos da pessoa do Autor, inexistindo qualquer desrespeito aos direitos de personalidade, tais como intimidade, a vida privada, a honra ou a imagem.
Mantenho.
Bem esclarece Yussef Said Cahali que seria até mesmo afrontoso aos mais sublimes sentimentos humanos negar-se que a morte de um ente querido, familiar ou companheiro, desencadeia naturalmente uma sensação dolorosa de fácil e objetiva percepção.
Por ser de senso comum, a verdade de tal afirmação dispensa demonstração: a morte antecipada em razão do ato ilícito de um ser humano fls.8 PROCESSO Nº TST-RR-92840-68.2007.5.02.0045 C/J PROC. Nº TST-AIRR-92841-53.2007.5.02.0045
de nossas relações afetivas, mesmo nascituro, causa-nos um profundo sentimento de dor, de pesar, de frustração, de ausência, de saudade, de desestímulo, de irresignação.
São sentimentos justos e perfeitamente identificáveis da mesma forma que certos danos simplesmente patrimoniais, e que revelam com mais ou menos intensidade, mas que sempre existem.
Prossegue o referido autor (Dano moral, 3ª ed., RT., São Paulo, p. 114): No estágio atual de nosso direito, com a consagração definitiva, até constitucional, do principio da reparabilidade do dano moral, não mais se questiona se esses sentimentos feridos pela dor moral comportam ser indenizados: não se trata de ressarcir o prejuízo material representado pela perda de um familiar economicamente proveitoso, mas de reparar a dor com bens da natureza distinta, de caráter compensatório e que, de alguma forma, servem como lenitivo" (fls. 733-745 - doc. seq. 1).
Em relação ao valor fixado para a indenização por dano moral, o Tribunal Regional concluiu:
"Os recorrentes pugnam pela reforma parcial. Buscam a alteração do valor da indenização que foi estabelecida pelo dano moral, de seiscentos mil reais, para um milhão de reais.
Aduzem, para tanto, que o referido arbitramento deve ocorrer mediante a aplicação do binômio de punição e compensação, ou seja, por meio da incidência da teoria do valor do desestímulo mediante o caráter punitivo da sanção pecuniária, juntamente com a teoria da compensação, visando destinar à vítima uma soma que compense o dano moral sofrido.
Afirmam ainda que devem ser considerados: o aspecto pedagógico, pelo que se deve ter em linha de conta a condição sócio-econômica do agente ofensor: e o aspecto compensatório da referida indenização, cujo arbitramento deve ocorrer em montante capaz de mitigar a dor e sofrimento causados pela conduta delituosa.
Asseguram que no aspecto punitivo a r. decisão conduziu-se de forma modesta, em face da condição sócio-econômica do ofensor, como expõem, e, ainda, não esteve atenta ao aspecto punitivo. fls.9 PROCESSO Nº TST-RR-92840-68.2007.5.02.0045 C/J PROC. Nº TST-AIRR-92841-53.2007.5.02.0045
Indicam o vulto econômico e a atuação da recorrida. Transcrevem doutrina e jurisprudência que entendem abonar a argumentação e, consequentemente, a pretensão.
Mantenho.
O julgado trouxe, para fundamentar o valor que foi arbitrado, entre outros fundamentos, aqueles relativos: à gravidade da doença do reclamante, letal; a falta de controle das substâncias utilizadas no ambiente de trabalho; a continuidade na utilização da mesma substância e o binômio referido pelos recorrentes.
Na realidade, não se vislumbra motivação outra para alterar o referido valor. Sobretudo quando há referência, também, à proporcionalidade.
Para a quantificação é de se observar que o legislador estabeleceu o critério, na forma que está consagrada no art. 953, parágrafo único, do Código Civil: caberá ao juiz fixar, equitativamente, o valor da indenização, na conformidade com as circunstâncias do caso.
Portanto, foi excluída de vez qualquer fixação apriorística mediante remissão ao estatuto penal ou legislação especial com respeito ao dano moral.
Toda limitação, prévia e abstrata, ao valor de indenização por dano moral, objeto de juízo de equidade, é incompatível com o alcance da indenizabilidade irrestrita assegurada pela atual Constituição da República. Por isso, já não vige o disposto no art. 52 da Lei de Imprensa, o qual não foi recebido pelo ordenamento jurídico vigente (STF RE nº 447.584-7-RJ – Relator Ministro Cezar Peluso, Boletim da AASP nº 2522, p. 1353).
A exegese admitida pela jurisprudência, usual e atual, sobretudo do e. STJ., bem como pela doutrina uniforme, é a de que, embora a dor não tenha preço e nem seja mensurável, o dano moral é reparável embora de forma incompleta e imperfeita.
O objetivo da indenização em dinheiro é o alívio, a amenização, a diminuição dos sentimentos negativos suportados pelo lesado, sob uma perspectiva de ‘correspondência’ ou ‘proporcionalidade’, e não de ‘equivalência’. fls.10 PROCESSO Nº TST-RR-92840-68.2007.5.02.0045 C/J PROC. Nº TST-AIRR-92841-53.2007.5.02.0045
Concomitantemente, busca impor sanção ao causador do dano, num influxo preventivo e como alerta, para que adote cautela e evite novas violações ou adoção futura de conduta ofensiva.
Assim, não visa à restituição absoluta do status quo da vítima anterior ao dano e nem à recomposição total da dor e da angústia que perpassaram o lesado.
Portanto, considerando-se numa panorâmica, consiste o objetivo dessa reparação pecuniária na defesa dos valores essenciais à preservação da personalidade humana e do convívio social, atribuindo à vítima algum tipo de compensação, bem como lhe devolvendo, na medida do possível, sua integridade física, psicológica e emocional.
E o valor a ser considerado pelo dano moral não pode ser tão alto a ponto de acarretar enriquecimento sem causa do autor ou de arruinar financeiramente o réu e nem pode ser tão baixo a ponto de não apenar o réu permitindo que ele reitere a ofensa praticada ou não repare o dano sofrido pelo autor.
Para a definição do seu valor, que não deve ser irrisório e nem absurdamente elevado, é necessário que o magistrado considere várias circunstâncias em cada caso específico, tais como a intensidade da culpa e do dano, a conduta e a capacidade econômica do ofensor, a repercussão da ofensa, a posição social ocupada pelo ofendido e as consequências por ele suportadas.
Para que essas metas sejam alcançadas, adquire relevância ímpar o julgamento realizado com prudência, moderação, equidade e razoabilidade, elementos indissociáveis que poderão ser obtidos não só a partir do bom senso do magistrado, mas também por meio do respeito à doutrina e à jurisprudência amplamente consolidadas (José Roberto Ferreira Gouvêa)" (fls. 715-721 - doc. seq. 01).
O reclamante interpôs recurso de revista às fls. 875-903 (doc. seq. 1), ao qual se negou seguimento às fls. 907-920 (doc. seq. 1), pelo fundamento de ser incidente o óbice da Súmula 221 do TST. Segundo a mesma decisão, os arestos trazidos são inespecíficos, como preconiza a Súmula 296 do TST. fls.11 PROCESSO Nº TST-RR-92840-68.2007.5.02.0045 C/J PROC. Nº TST-AIRR-92841-53.2007.5.02.0045
Inconformado, o reclamante interpôs agravo de instrumento às fls. 3-25 (doc. seq. 1), alegando que deve ser majorado para R$ 1.000.000,00 o valor fixado a título de indenização por danos morais, haja vista as funções compensatória, punitiva e social que devem permear a respectiva reparação. Indica violação dos artigos 5º, V e X, e 7º, XXVIII, da Constituição Federal e colaciona arestos para o cotejo de teses.
Com razão, sem embargo de serem judiciosos os fundamentos do acórdão hostilizado.
Incontroverso nos autos o diagnóstico de mesotelioma pleural, assim como o nexo de causalidade entre a doença e o produto utilizado na empresa (asbesto), de forma que não se está a discutir aqui a caracterização como doença ocupacional, mas tão somente o valor fixado para a indenização por danos morais frente a esse quadro.
Entretanto, não se pode adentrar ao exame do quantum indenizatório grosso modo, sem antes pincelar algumas considerações a respeito do dano moral e da responsabilidade da empregadora. A relevância da questão posta em debate torna imprescindível essa digressão.
Impressiona à consciência social, e circunstancialmente à do julgador, o aspecto de o dano a ser reparado estar relacionado não apenas com a atividade de risco pontual, inerente a funções topicamente exercidas por empregado em dada empresa, mas de morte e expiação de trabalhador envolvido em atividade econômica dirigida, em seu núcleo e possíveis projeções, à exploração de fibra mineral cuja inalação é, hoje, reconhecidamente letal. Cogita-se, portanto e na ação lesiva, o desapreço à vida e ao projeto humano e transgeracional, universal e essencialmente jurídico de um meio ambiente ecologicamente equilibrado (artigo 225, Constituição Federal), inclusive no que toca ao meio ambiente do trabalho (artigo 200, VIII, Constituição Federal).
O dano moral refere-se aos prejuízos que não atingem o patrimônio financeiro e econômico do indivíduo, mas bens de caráter imaterial ligados ao sentimento interior do indivíduo para com ele mesmo e para com a sociedade, tais como a integridade física, a saúde, a correção fls.12 PROCESSO Nº TST-RR-92840-68.2007.5.02.0045 C/J PROC. Nº TST-AIRR-92841-53.2007.5.02.0045
estética, a liberdade, a reputação. A ofensa objetiva desses bens imateriais tem um reflexo subjetivo na vítima traduzido em dor, sofrimento, espanto, frustração, aflição, entre outros sentimentos que, nas palavras do Desembargador Ruy Trindade (RT 613/184), abalam a parte mais sensível do indivíduo, qual seja: o seu espírito.
Na doutrina, merece destaque o ensinamento do Professor Yussef Said Cahali, que assim define o dano moral:
"a privação ou diminuição daqueles bens que têm um valor precípuo na vida do homem e que são a paz, a tranquilidade de espírito, a liberdade individual, a integridade individual, a integridade física, a honra e os demais sagrados afetos, classificando-se desse modo, em dano que afeta a parte social do patrimônio moral (honra, reputação, etc.) e dano que molesta a parte afetiva do patrimônio moral (dor, tristeza, saudade, etc.), dano moral que provoca direta ou indiretamente dano patrimonial (cicatriz deformante, etc.) e dano moral puro (dor, tristeza, etc.)" (in Dano Moral, Editora Revista dos Tribunais, SP, 1998, 2ª edição, p. 20).
A lição do Ministro Walmir Oliveira da Costa revela o seguinte conceito:
"o dano moral é aquele que atinge o ser humano em seus valores mais íntimos, causando-lhe lesões em seu patrimônio imaterial, como a honra, a boa-fama, a dignidade, o nome etc., bens esses que, em sua essência, isto é, considerados em si mesmos (do ponto de vista ontológico), não são suscetíveis de aferição econômica, mas, sim, seus efeitos ou reflexos na esfera lesada. O dano material, ao contrário, lesa bens corpóreos que são suscetíveis de valoração pecuniária" (in Dano Moral nas relações laborais. 2.ª ed., Curitiba: Juruá, 2008, p. 33.)
Uma vez definido dano moral, passa-se à questão de sua caracterização para fins indenizatórios, cuja discussão refere-se à verificação da existência dos pressupostos necessários para a reparação. Nesse debate, há duas correntes. Uma que defende a necessidade da fls.13 PROCESSO Nº TST-RR-92840-68.2007.5.02.0045 C/J PROC. Nº TST-AIRR-92841-53.2007.5.02.0045
comprovação da dor/sofrimento e a outra que, presumindo o dano, entende pela necessidade de se comprovar apenas o ato praticado pelo agente e o nexo causal com a dor.
A segunda corrente, a qual defende a prova apenas da violação do direito constitucionalmente garantido, dispensando a prova do prejuízo, é mais coerente com a própria definição do dano moral e vem sendo adotada no Superior Tribunal de Justiça, conforme se verifica nas seguintes decisões:
"a concepção atual da doutrina orienta-se no sentido de que a responsabilização do agente causador do dano moral opera-se por força do simples fato da violação (damnum in re ipsa), não havendo que se cogitar da prova do prejuízo" (REsp nº 23.575-DF, Relator Ministro César Asfor Rocha, DJU 1º/9/1997.)
"Dano moral - Prova. Não há que se falar em prova do dano moral, mas, sim, na prova do fato que gerou a dor, o sofrimento, sentimentos íntimos que os ensejam (...)." (REsp nº 86.271-SP, Relator Ministro Carlos A. Menezes, DJU 9/12/1997.)
In casu, ficou evidenciado, no acórdão regional, que o de cujus adquiriu doença ocupacional, a qual resultou em sua morte, relacionada com asbesto, material usado na reclamada, a caracterizar, assim, o nexo de causalidade com a atividade desenvolvida e a culpa da empresa. Esses fatores vêm a demonstrar, por consequência, a inserção e aplicação da teoria da responsabilidade civil subjetiva do empregador, a despeito da conclusão do Tribunal Regional de se estar diante de hipótese de responsabilidade objetiva.
Portanto, embora possa a reclamada, equivocadamente, crer que tal dano não tenha causado prejuízos na esfera íntima da lesada, o dano moral tem característica peculiar, in re ipsa, derivando da própria natureza do fato. Sergio Cavalieri Filho ensina que o dano moral está ínsito na ofensa em si e decorre da gravidade do ilícito. Deriva inexoravelmente do próprio fato ofensivo, de tal modo que, provada a fls.14 PROCESSO Nº TST-RR-92840-68.2007.5.02.0045 C/J PROC. Nº TST-AIRR-92841-53.2007.5.02.0045
ofensa, ipso facto está demonstrado o dano moral a guisa de uma presunção natural, uma presunção hominis ou facti, a qual decorre das regras da experiência comum (in Programa de Responsabilidade Civil, 8ª ed., São Paulo, Atlas: 2008, pág. 86). Em outras palavras, tratando-se de dano moral, exige-se a prova do fato, e não do dano, devendo a dor apenas guardar nexo com o ato ilícito praticado. Nesse sentido, há precedente desta 6ª Turma de minha relatoria (RR-25700-03-2005-5-04-0701, DEJT 9/4/2010).
A jurisprudência uniformizadora da SBDI-1 desta Corte, acompanhando a segunda corrente e especialmente quando está a cuidar de morbidez funcional, entende que a caracterização do dano moral se dá pela violação de um direito geral de personalidade, suficiente para configurar-se a responsabilidade a demonstração do evento, sendo dispensada a prova do prejuízo para fins de constatar a lesão à honra, visto que sentimentos como a tristeza, a angústia, a dor emocional da vítima são apenas presumidos (presunção hominis) e, por isso, prescindíveis de comprovação em juízo.
Citem-se os seguintes precedentes da SBDI-1 do TST:
"RECURSO DE EMBARGOS - INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL - DOENÇA PROFISSIONAL - PROVA - DESNECESSIDADE. O dano moral poder ser conceituado como o vilipêndio a direito da personalidade do lesado, atingindo aspectos não patrimoniais da vida do ser humano. Tal dano decorre, pois, da demonstração objetiva de que a conduta de alguém lesou direto da personalidade de outrem. Assim, inviável exigir-se a prova do sofrimento daquele que suporta o citado dano, pois, nesse caso, estar-se-ia impondo o ônus de demonstrar algo que não se concretiza no mundo dos fatos, mas, tão somente, no âmbito psicológico do lesado. A doutrina e a jurisprudência têm entendido que o dano moral é damnum in re ipsa, sendo, no caso, suficiente, para fins de atribuição de responsabilidade, a demonstração do evento, doença profissional, e fixado o nexo de causalidade." (E-ED-RR - 816513-56.2001.5.15.5555, Min. Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, DEJT 23/10/2009.) fls.15 PROCESSO Nº TST-RR-92840-68.2007.5.02.0045 C/J PROC. Nº TST-AIRR-92841-53.2007.5.02.0045
"RECURSO DE EMBARGOS EM RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO EMBARGADO PUBLICADO SOB A ÉGIDE DA LEI 11.496/2007. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. DOENÇA OCUPACIONAL. INCAPACITAÇÃO PARA O TRABALHO. PROVA. Concebendo o dano moral como a violação de direitos decorrentes da personalidade, estes entendidos como categoria especial de direitos subjetivos que, fundados na dignidade da pessoa humana, garantem o gozo e o respeito ao seu próprio ser, em todas as suas manifestações espirituais ou físicas (BELTRÃO, Sílvio Romero, Direitos da Personalidade, São Paulo: Editora Atlas, 2005, p. 25), a sua ocorrência é aferida a partir da violação perpetrada por conduta ofensiva à dignidade da pessoa humana, sendo dispensada a prova de prejuízo concreto, já que a impossibilidade de se penetrar na alma humana e constatar a extensão da lesão causada não pode obstaculizar a justa compensação. Depois de restar superada a máxima segundo a qual não há responsabilidade sem culpa, tendo-se encontrado na teoria do risco um novo e diverso fundamento da responsabilidade, desmentido se vê hoje, também o axioma segundo o qual não haveria responsabilidade sem a prova do dano, substituída que foi a comprovação antes exigida pela presunção hominis de que a lesão a qualquer dos aspectos que compõem a dignidade humana gera dano moral (MORAES, Maria Celina Bodin de. Danos à pessoa humana: uma leitura civil-constitucional dos danos morais - Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 159-60). O dano moral caracteriza-se pela simples violação de um direito geral de personalidade, sendo a dor, a tristeza ou o desconforto emocional da vítima sentimentos presumidos de tal lesão (presunção hominis) e, por isso, prescindíveis de comprovação em juízo (DALLEGRAVE NETO, José Affonso, Responsabilidade Civil no Direito do Trabalho - 2ª ed. - São Paulo, LTr, 2007, p. 154). Dispensa-se a prova do prejuízo para demonstrar a ofensa ao moral humano, já que o dano moral, tido como lesão à personalidade, ao âmago e à honra da pessoa, por sua vez é de difícil constatação, haja vista os reflexos atingirem parte muito própria do indivíduo o seu interior. De qualquer forma, a indenização não surge somente nos casos de prejuízo, mas também pela violação de um direito (STJ, Resp. 85.019, 4ª Turma, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, julgado em 10.3.98, DJ 18.12.98). Os deveres fls.16 PROCESSO Nº TST-RR-92840-68.2007.5.02.0045 C/J PROC. Nº TST-AIRR-92841-53.2007.5.02.0045
de lealdade ‘adstringem as partes a não praticar atos, comissivos ou omissivos , anteriormente à conclusão do contrato, durante a vigência dele ou até após a sua extinção, que venham a frustrar as expectativas corporificadas no contrato ou nele legitimamente sustentadas’ (SILVA, Jorge Cesa [sic] Ferreira da. A boa-fé e a violação positiva do contrato - Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 112). A incapacitação para o trabalho e para muitas atividades diárias triviais acarretada pelo exercício do labor, aliada à quebra do dever de cuidado por parte do empregador - em face da ausência da adoção de programas destinados a evitar o surgimento de doenças comuns às atividades executadas na empresa -, conforme registrado no acórdão regional, ensejam a condenação ao pagamento de compensação por dano moral. Recurso de embargos conhecido e não provido." (E-RR - 625/2006-052-18-00.6, Min. Rosa Maria Weber Candiota da Rosa, DJ 17/4/2009.)
Frise-se que os princípios constitucionais nos quais se funda a própria República Federal do Brasil, de respeito à dignidade da pessoa humana e aos valores sociais do trabalho (artigo 1º, III e IV, da Constituição Federal), impõem consideração à pessoa do trabalhador, principalmente quando doente ou acidentado no trabalho.
A Ministra Kátia Magalhães Arruda considera que "os direitos elencados em razão da segurança do trabalhador guardam correlação com o direito à vida e à saúde, o que confirma a interligação com os direitos fundamentais" (in Direito constitucional do trabalho: sua eficácia e o impacto do modelo neoliberal. São Paulo: LTr, 1988. p. 77). A ilação que se extrai, pois, é que não se pode negar a característica de direito fundamental, alçado pela atual Constituição da República, daqueles direitos relacionados em seu artigo 7º, como o são aqueles insculpidos nos incisos XXII e XXVIII:
"XXII - redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança;
(omissis) fls.17 PROCESSO Nº TST-RR-92840-68.2007.5.02.0045 C/J PROC. Nº TST-AIRR-92841-53.2007.5.02.0045
XXVIII - seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa;"
Assim, toda a dimensão humana deve ser reconhecida e protegida, de modo que a dignidade compreendida constitucionalmente está fundamentalmente correlacionada com a atividade econômica e sua respectiva função social. É como se pode depreender o disposto nos artigos 1º, 3º, 170 e 225 da Constituição Federal:
"Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
(omissis)
III - a dignidade da pessoa humana;
IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
V - o pluralismo político."
"Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
(omissis)
III - função social da propriedade;
(omissis)
VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação;
(omissis)" (grifei).
"Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações." fls.18 PROCESSO Nº TST-RR-92840-68.2007.5.02.0045 C/J PROC. Nº TST-AIRR-92841-53.2007.5.02.0045
Assim esclarece Norma Sueli Padilha, em artigo intitulado "Responsabilidade Social da Empresa pela Implementação do Equilíbrio do Meio Ambiente do Trabalho":
"A proposta constitucional brasileira, de elevar à qualidade de direito fundamental o direito ao meio ambiente, sugere um novo paradigma, que afeta diretamente as relações do trabalho e da produção, pois trata-se do compromisso com a sustentabilidade socioambiental, na medida em que adota um modelo de produção que, embora baseado na livre-iniciativa e, portanto, na apropriação privada de bens, também se assenta sobre a valorização do trabalho humano e tem como um dos seus princípios a defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado.
(...)
E, na leitura principiológica dos valores protegidos pelo art. 225 do Texto Constitucional, não resta dúvida de que dentre ‘todos’ incluem-se o ser humano na sua qualidade de trabalhador, pois no exercício dessa condição submete diariamente sua saúde e energia, vitais a um ambiente, que embora artificialmente construído, deve também proporcionar-lhe sadia qualidade de vida, por meio de controle de agentes degradadores que possam afetar sua saúde em todos os seus múltiplos aspectos.
Inúmeras são as agressões e pressões sobre o equilíbrio do meio ambiente do trabalho, acirradas pelas mudanças profundas no mundo do trabalho, geradas pelo crescente avanço tecnológico e as inúmeras causas de instabilidade econômica, principalmente em tempos de crise mundial sem precedentes, com consequências nefastas para a qualidade de vida do ser humano no seu ambiente de trabalho, atingindo diretamente sua saúde física, mental e psicológica. Nesse contexto, buscar uma maior rede de proteção jurídica desse direito fundamental do trabalhador – o equilíbrio de seu ambiente de trabalho – que atinge diretamente sua dignidade e qualidade de vida, é um dever que se impõe aos implementadores da proteção dos direitos do trabalhador.
É impossível falar-se de alargamento da rede de proteção da dignidade, saúde e qualidade de vida no trabalho e pelo trabalho sem propugnar-se um necessário rompimento de abordagens fragmentadas que não propiciam nem fls.19 PROCESSO Nº TST-RR-92840-68.2007.5.02.0045 C/J PROC. Nº TST-AIRR-92841-53.2007.5.02.0045
albergam a extensão da temática ambiental, tão abrangente e complexa. Nesse sentido, é um desafio para o direito garantir um sistema de proteção eficaz para alcançar a abrangência do meio ambiente, pois a realidade contemporânea de estágio de degradação ambiental exige redobrada articulação social diante da dimensão dos problemas ambientais e toda sua complexidade, que abarca e atinge soberbamente o ambiente onde o ser humano passa a maior parte de sua vida produtiva, qual seja, o meio ambiente do trabalho.
Assim, é relevante destacar que, o meio ambiente do trabalho embora se encontre numa seara comum ao direito do trabalho e ao direito ambiental, distintos serão os bens juridicamente tutelados por ambos, uma vez que enquanto o primeiro ocupa-se preponderantemente das relações jurídicas havidas entre empregado e empregador, nos limites de uma relação contratual privatística, o direito ambiental, por sua vez, irá buscar a proteção do ser humano trabalhador contra qualquer forma de degradação do ambiente onde exerce sua atividade laborativa." (in Diálogos entre o direito do trabalho e o direito civil/Gustavo Tepedino, coordenadores ... [et al] – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013, pp. 200-201.)
Em rigor, tem-se verificado a ampliação do ângulo de incidência dos direitos humanos, que se abre desde a dimensão individual até atender à tutela coletiva, ou desde o interesse do coletivo até evoluir na direção de contemplar, em perspectiva ecológica, a causa humanitária. Vale dizer: à afirmação dos direitos subjetivos de liberdade se seguiram os direitos sociais e após as garantias institucionais, que fundiram as ideias de interesse coletivo e de pertencimento à coletividade, seguindo-se enfim a percepção de que os direitos do homem somente se realizam em plenitude quando alcançam igualmente a todos e se preserva, ademais, a possibilidade de se subsistirem esses direitos a favor das futuras gerações.
Em suma, o direito ambiental impregna os direitos humanos dos postulados da harmonia e da solidariedade. Trata da relação recíproca entre o homem e o meio ambiente, tratando, assim e fls.20 PROCESSO Nº TST-RR-92840-68.2007.5.02.0045 C/J PROC. Nº TST-AIRR-92841-53.2007.5.02.0045
simultaneamente, de ecologia e de equilíbrio, em um projeto ambicioso de um Direito para toda a humanidade.
A Constituição Brasileira, quando assegura o direito fundamental à saúde, inclui a proteção do meio ambiente do trabalho (artigo 200, VIII), o que significa a tutela, no âmbito ubíquo do direito ambiental, de todos os direitos que concorrem para preservar a saúde do homem em qualquer ambiente de trabalho. Direitos tais que abarcam as condições de tempo e de modo do trabalho, bem assim a imunidade contra agentes insalubres ou qualquer outro risco do lugar de onde provêm tanto a produção econômica quanto os meios de subsistência do trabalhador, promovendo assim o necessário equilíbrio entre o ecossistema laboral e a biosfera.
Pode-se chegar à conclusão de que a Constituição deve ser apreendida não como um conjunto de normas estanques, mas um todo concatenado e harmônico, nela incluído como princípio da ordem econômica a defesa do meio ambiente do trabalho e a função social da empresa na busca da redução dos riscos à saúde do trabalhador, aqui considerando a qualidade do meio ambiente.
Não há como se cogitar, pois, de liberdade de empresa sem responsabilidade social. Nesse ponto, mais uma vez, elucidativa é a lição extraída do artigo de Norma Sueli Padilha:
"Uma empresa socialmente responsável demonstra compromisso com a qualidade de vida de seus trabalhadores e consumidores, por meio de práticas sustentáveis e de equidade, que promovam o desenvolvimento sustentável em prol dos seus funcionários e da comunidade, implementando a preservação do equilíbrio do meio ambiente. A responsabilidade social empresarial redefine o papel das empresas numa sociedade que pretende promover a sustentatibilidade socioambiental, pois trata-se de assumir de forma consciente o compromisso social de corresponsabilidade no desenvolvimento social e na preocupação em aliar desenvolvimento econômico ao desenvolvimento da qualidade de vida, para além da qualidade de serviços e produtos.
(...) fls.21 PROCESSO Nº TST-RR-92840-68.2007.5.02.0045 C/J PROC. Nº TST-AIRR-92841-53.2007.5.02.0045
Por outro lado, uma empresa socialmente responsável investe na aplicação integral dos princípios ambientais da precaução e prevenção no ambiente de trabalho, bem como do poluidor-pagador, que se refletem na adoção de práticas de gestão ambiental, não apenas para controle de fontes de poluição ou degradação ambiental já existentes, mas também com ações preventivas que concretizem o direito ao equilíbrio no meio ambiente" (op. cit. pp. 208-209)
A par dos princípios próprios do direito ambiental e sua projeção na relação laboral, faz-se necessário esclarecer aqui os princípios da prevenção e o da precaução. Enquanto este incide nas hipóteses de ignorância ou incerteza acerca dos riscos ambientais, aquele atua quando os riscos são conhecidos e, justamente pelo fato de serem previsíveis, devem ser evitados.
Um debate que ilustra o avanço desde a prevenção até a precaução, a propósito de matéria que envolve também interesse laboral, encontra-se nos processos judiciais acerca do uso do amianto ou asbesto no Brasil. A saber, asbesto é o nome adotado para seis materiais fibrosos (grunerita, crisotila, riebeckita, tremolita, bisolita e antofilita) que se acham na natureza e apresentam interessantes propriedades com baixo custo de extração.
Tem-se utilizado o amianto para incontáveis aplicações industriais ou na composição de inúmeros produtos manufaturados, inclusive como material de construção (telhas, azulejos, cimento), em insumos da indústria automobilística (embreagem, freio, componentes de transmissão) e da indústria têxtil (seu efeito isolante e sua resistência ao calor e a chamas o fazem útil na indumentária dos bombeiros e em equipamentos de proteção individual), em embalagens e revestimentos, tintas, talco etc. À exceção da crisotila, todas as formas de amianto são muito resistentes aos ácidos e aos álcalis e todas se decompõem a altas temperaturas (800/1000ºC), daí por que usadas para a proteção ignífuga de estruturas metálicas, trajes de bombeiros etc.
O Brasil é um dos maiores produtores mundiais de amianto e, segundo René Mendes (in Patologia do Trabalho. 3ª ed. São fls.22 PROCESSO Nº TST-RR-92840-68.2007.5.02.0045 C/J PROC. Nº TST-AIRR-92841-53.2007.5.02.0045
Paulo: Editora Atheneu, 2013), alcançou no ano de 2011, o posto de segundo exportador mundial e o quarto lugar como consumidor, sendo a produção aqui destinada à indústria de fibrocimento brasileira.
Na Europa, a Directiva nº 1.999/77 da União Europeia, "considerando que ainda não foi identificado o nível mínimo de exposição abaixo do qual o crisótilo de amianto não produz riscos cancerígenos", proibiu todas as formas de amianto, inclusive a crisotila, a partir de 2005. Mesmo antes de essa proibição vigorar, a Espanha proscreveu a comercialização e utilização de todas as variedades do amianto desde dezembro de 2001 (Ordem de 7 de dezembro de 2001, com publicação no BOE nº 229, de 14 de dezembro). Também se anteciparam à citada directiva, banindo logo todas as formas de amianto, a Alemanha, a Áustria, a Bélgica, a Dinamarca, a Finlândia, a França, a Grã Bretanha, a Itália, a Noruega, a Polônia, os Países Baixos, a República Tcheca, a Suécia e a Suíça. Tal banimento igualmente se deu na Arábia Saudita, na Argentina, no Chile, nos Emirados Árabes, na Eslovênia e na Nova Zelândia. Estados Unidos enceta gradualmente a proibição do amianto, desde 1989, e o Canadá foi um dos primeiros países a proibir o amianto branco, apesar de ser um dos seus principais exportadores (junto com Zimbábue, China, Rússia e Brasil) para países em desenvolvimento.
Sobre esses dados, conclui René Mendes:
"A tendência de decréscimo, ou mesmo eliminação da utilização do asbesto no mundo, é um fato, com um número crescente de países que legalmente proibiram sua mineração, transformação e comércio, tendo em vista seus efeitos deletérios, incluindo populações não ocupacionalmente expostas. Mesmo que este risco seja eliminado no país, certamente seremos testemunhas de suas consequências nos próximos 50 anos." (in Patologia do Trabalho. 3ª ed. São Paulo: Editora Atheneu, 2013. p. 1261.)
A questão é mais candente, assim, no tocante à crisotila, ou amianto branco, que é a fibra de amianto de maior utilização, sobretudo na indústria de fribocimento, o que representa 85% do uso total da produção mundial. fls.23 PROCESSO Nº TST-RR-92840-68.2007.5.02.0045 C/J PROC. Nº TST-AIRR-92841-53.2007.5.02.0045
O Brasil ratificou em 1991 a Convenção nº 162 da OIT (Decreto Executivo nº 126, DOU 23/5/1991), que impõe a obrigação de incluir na legislação nacional medidas de prevenção e controle dos riscos à saúde devidos à exposição profissional ao asbesto, e logo se editou entre nós a Lei nº 9.055, de 1995, que proibiu a utilização industrial e a comercialização de algumas variedades do amianto pertencentes ao grupo das anfibólicas, mas autorizou a extração e utilização do tipo crisotila ou amianto branco. A transigência do Brasil em relação a essa espécie certamente resultou de estudos desenvolvidos ao início da década de 1990 por pesquisadores canadenses, que concluíram ser menos nocivo o amianto branco, dado que as investigações informavam os tipos anfibólicos – entre os quais não se inclui o crisotila – como os mais presentes em cânceres de pulmão.
Todavia, antigas e novas pesquisas comprovariam a presença exclusiva ou predominante da fibra do amianto branco, crisotila, em pessoas que adoeceram com placa pleural ou mesotelioma. A autorização para que se produza e comercialize o amianto branco no Brasil causou imediata reação de algumas entidades da Federação (Mato Grosso do Sul, São Paulo e Pernambuco), as quais proscreveram igualmente o amianto crisotila no âmbito de seus territórios, por meio de leis estaduais cuja validade foi impugnada no âmbito do Supremo Tribunal Federal.
A reação dos atores sociais e da comunidade jurídica bem diz sobre o desassossego que a matéria em todos provoca: por um lado, a Associação Nacional do Transporte de Cargas e Logística intentou arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF nº 234) contra o Governador do Estado de São Paulo, porque obstaculizado o transporte dos produtos do amianto na região geográfica correspondente ao estado paulista; também a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria propôs ação direta de inconstitucionalidade (ADI nº 3.937), visando a impugnar a eficácia da lei paulista vedadora do comércio do amianto. E o Governador do Estado de Goiás ajuizou ações diretas de inconstitucionalidade contra a mesma lei paulista (ADI nº 2.656/SP) e contra a lei sul-mato-grossense (ADI nº 2.396/MS), logrando êxito em sua fls.24 PROCESSO Nº TST-RR-92840-68.2007.5.02.0045 C/J PROC. Nº TST-AIRR-92841-53.2007.5.02.0045
tentativa de obter a ineficácia das leis que, embora emanadas em outros estados, repercutiam na economia de Goiás.
Por outro lado, a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho e a Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho propuseram ação direta de inconstitucionalidade (ADI 4.066) em que pedem a revogação do artigo 2º da Lei nº 9.055/1995, o qual permite a exploração comercial e industrial do amianto branco (crisotila). As entidades associativas sustentam que a lesividade do crisotila à saúde humana, mesmo em parâmetros controlados, é notoriamente constatada por estudos científicos. Ao fim de agosto de 2012, por designação do Ministro Marco Aurélio, o Supremo Tribunal Federal determinou a realização de audiência pública para ouvir depoimentos contrários ou favoráveis à produção e comercialização do amianto branco.
Do sítio oficial do Supremo Tribunal Federal, extraem-se as seguintes informações contrárias ao amianto branco, colhidas na ocasião da referida audiência pública:
"Por indicação da Associação Brasileira de Expostos ao Amianto, Arthur Frank, membro do Collegium Ramazzini, professor patologista e pesquisador dos efeitos cancerígenos da espécie crisotila de amianto, compartilhou opiniões sobre os perigos do amianto, especialmente a crisotila, em sua apresentação realizada durante audiência pública no Supremo Tribunal Federal (STF). Há mais de 40 anos ele estuda os efeitos do amianto.
‘O ponto mais importante que eu quero levantar é que todas as formas de amianto, inclusive o crisotila, causam uma série de doenças malignas e não malignas’, ressaltou. O professor disse que não falaria apenas de suas próprias opiniões, mas sobre o que organizações internacionais consideram sobre o assunto, tais como a Agência Internacional para a Pesquisa do Câncer, a Organização Internacional do Trabalho e a Organização Mundial da Saúde, entre outras. ‘Todas as formas de amianto, inclusive a crisotila, são perigosas. Chegamos a essa conclusão com base naquilo que estudos científicos nos mostram e não por conta das fontes de financiamento da origem das informações’, salientou. fls.25 PROCESSO Nº TST-RR-92840-68.2007.5.02.0045 C/J PROC. Nº TST-AIRR-92841-53.2007.5.02.0045
‘Pessoalmente, já testemunhei vítimas de amianto ao longo dos anos. Os meus estudos envolvem culturas de células, órgãos, animais e humanos e eu realizei trabalhos não apenas nos Estados Unidos, mas na China, Sri Lanka, Israel, Índia e outros países, com dezenas de publicações sobre o perigo do amianto’, disse. Segundo ele, ‘todos os tipos de amianto foram reconhecidos como carcinogênicos’. ‘Da mesma forma, há outros tipos de amianto carcinogênicos como benzeno, benzila e muitos outros’, afirmou.
De acordo com o professor, com exceção do amianto, todos esses compostos são rapidamente metabolizados pelo organismo, levando ao desenvolvimento de câncer que ocorre décadas após a exposição. ‘As fibras de amianto podem se movimentar no organismo, muitas delas permanecerão para sempre nos pulmões, na pleura, nos rins, em qualquer outro órgão e, com o tempo, causar o câncer, até atravessam a placenta durante a gestação dos bebês’, acrescentou.
Quanto ao uso de cimento de amianto, ele revelou que há um estudo da Noruega mostrando um aumento de câncer gastrointestinal em indivíduos que consumiram água de cisternas de amianto. Apesar de apresentar muitas informações que são fontes de pesquisa em todo o mundo, Arthur Frank considerou que a ausência de dados não significa ausência de doenças.
‘É verdade que mais de 55 países baniram totalmente o uso do amianto em todas as suas formas e outros países adotaram restrições’, informou. ‘Parece haver substitutos adequados ao amianto. Não há necessidade de continuar a usar amianto nesse mundo’, ressaltou o professor.
‘Esperamos que esta Corte Suprema reconheça os perigos do amianto, inclusive o da crisotila, e que o Brasil se una aos países civilizados que baniram o uso do amianto como uma das melhores e maiores ações que podem ser feitas em favor dos seus semelhantes: banir qualquer elemento contendo amianto e que possa levar ao câncer’, concluiu."
"O epidemiologista italiano Benedetto Teracini, responsável por estudos epidemiológicos sobre os efeitos do amianto na região de Piemonte, na Itália, questionou, em sua exposição na audiência pública realizada no Supremo Tribunal Federal, os resultados apresentados por estudos brasileiros sobre o tema. Ele demonstrou o que considera falhas fls.26 PROCESSO Nº TST-RR-92840-68.2007.5.02.0045 C/J PROC. Nº TST-AIRR-92841-53.2007.5.02.0045
metodológicas que comprometem a confiabilidade dos estudos. Ele se apresentou na audiência pública por indicação da Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto (ABREA).
Teracini atuou como consultor do juiz e, em alguns casos, da acusação em vários processos sobre doenças relacionadas ao amianto em Casale Monferrato, onde se registraram 4 mil mortes num período de 40 anos entre trabalhadores e, na mesma área, um surto de mesotelioma na população em geral. O especialista classifica o caso como ‘uma verdadeira tragédia’, e disse que ainda ocorrem cerca de 40 novos casos por ano ‘em pessoas que jamais trabalharam com o amianto, mas foram expostos a ele no meio ambiente’. A situação em Casale Monferrato resultou na condenação, pela Justiça de Turim, dos proprietários de uma empresa do ramo a 16 anos de reclusão.
Com base no conhecimento acumulado ao longo da carreira médica e científica, Terracini questionou dois estudos epidemiológicos realizados recentemente no Brasil – o acompanhamento de trabalhadores das minas de São Félix e Canabrava, de 2005, e uma avaliação dos riscos à saúde de viver pelo menos 15 anos em casas com telhas de amianto.
O primeiro tinha por objetivo estudar as consequências da melhoria dos locais de trabalho ao longo de seis décadas nas minas de amianto. Segundo o epidemiologista, o resultado obtido não garante que os trabalhadores contratados mais recentemente nas minas estejam livres de qualquer risco de desenvolver doenças, sobretudo devido ao longo período de latência das patologias relacionadas ao amianto.
‘O estudo compara grupos diferentes de trabalhadores – em períodos diferentes e com diferentes condições de trabalho, dos mais precários nas décadas de 40-60 até os mais recentes, após a adoção de medidas de controle ambiental’, explicou. Entre as falhas apontadas, Teracini citou erros na seleção da amostragem e o pouco tempo de acompanhamento dos trabalhadores do último grupo, que dispõem do maior nível de proteção da história da mina. Mencionou também a inexistência de levantamentos de casos de câncer. ‘De acordo com minha experiência na Itália, você identifica casos de mesotelioma se procurar por eles. Se não procurar, não vai achá-los’, concluiu. fls.27 PROCESSO Nº TST-RR-92840-68.2007.5.02.0045 C/J PROC. Nº TST-AIRR-92841-53.2007.5.02.0045
No segundo estudo, o objetivo era avaliar os riscos e os efeitos à saúde de residir em casas com telhas de amianto por mais de 15 anos, por meio de entrevistas e análises clínicas da função respiratória em 550 pessoas aparentemente saudáveis. Nele, o especialista italiano questionou a base lógica, uma vez que, de acordo com a literatura científica, não é esperado que tais níveis de exposição comprometam a função respiratória. ‘Nesses níveis, considerados ‘baixos’, a preocupação principal são os riscos de mesotelioma, e este não era objeto do estudo’, assinalou.
Benedetto Teracini encerrou falando sobre o que se aprendeu com a experiência de Casale Monferrato. ‘Os mais expostos foram os trabalhadores que atuavam na colocação, substituição e manutenção de telhas de amianto, como pedreiros e assentadores de tijolos e de telhados’, afirmou. ‘Mas aprendemos que há outras fontes de exposição para a população em geral nas vizinhanças da fábrica, como no uso inadequado de resíduos do processo industrial do amianto para pavimentar espaços como praças e quintais, na utilização de flocos e fibras para isolamento térmico e no transporte do amianto’."
Por respeito à dialética, registro também os depoimentos favoráveis à produção do amianto, a despeito da voz uníssona e dissonante da comunidade internacional:
"O biólogo Thomas Hesterberg, doutor em toxicologia, falando em nome da Confederação Nacional dos Trabalhadores da Indústria (CNTI) na audiência pública sobre o amianto, afirmou que não há dados que garantam que os substitutos usualmente apontados no Brasil para a crisotila – principalmente o polipropileno e a fibra de celulose – sejam seguros.
Sua exposição centrou atenção nos riscos potenciais à saúde decorrentes da exposição à crisotila, com a tese de que a limitação dos níveis de exposição, o controle ambiental das áreas de trabalho e a limpeza adequada dos locais resultam em risco zero. Hesterberg apresentou estudos com animais expostos a níveis cinco mil vezes superiores aos existentes em ambientes de trabalho com a crisotila produzida no Brasil que não apresentaram nenhuma doença pulmonar. fls.28 PROCESSO Nº TST-RR-92840-68.2007.5.02.0045 C/J PROC. Nº TST-AIRR-92841-53.2007.5.02.0045
Os parâmetros para a avaliação de riscos de exposição a fibras se resumem, segundo o especialista, a três ‘D’s: dose (quantidade que chega aos pulmões), dimensão (fibras finas se depositam nas áreas mais profundas, fibras longas são mais tóxicas) e durabilidade (quanto mais durável, mais tóxica). Nesses três critérios reside a principal diferença entre a crisotila e as formas anfibólicas do amianto.
Segundo o toxicólogo, o tempo médio de eliminação da crisotila brasileira do organismo é de 1,3 dia, inferior ao de fibras artificiais classificadas como não carcinogênicas pela Agência Internacional de Pesquisas sobre Câncer (IARC). ‘A crisotila pode ser usada com segurança’, garante.
Hesterberg apresentou também estudos sobre os possíveis substitutos para a fibra mineral feitos pela IARC em 2005 para demonstrar a ausência de garantias quanto a sua segurança. A fibra de celulose, afirma, tem biopersistência de mil dias no organismo e está relacionada a excesso de casos de câncer de pulmão, doenças pulmonares obstrutivas e asma entre trabalhadores da indústria de papel. O polipropileno demonstra alta toxicidade à inalação, e os níveis de fibras no pulmão têm aumentado ao longo do tempo, juntamente com os de doenças pulmonares reversíveis.
A conclusão apresentada pelo especialista é a de que a crisotila não é tóxica em níveis baixos de exposição. Por ser eliminada do organismo em poucos dias, representa baixo risco para as pessoas expostas e pode ser usada com segurança, ao contrário de seus substitutos, que ainda não foram adequadamente testados."
"O último expositor da audiência pública realizada no Supremo Tribunal Federal (STF) foi Adilson Conceição Santana, presidente da Federação Internacional dos Trabalhadores do Amianto Crisotila (FITAC), vice-presidente da Comissão Nacional dos Trabalhadores do Amianto (CNTA) e diretor secretário do Sindicato dos Trabalhadores na Indústria da Extração de Minerais Não-Metálicos de Minaçu (GO). ‘É perfeitamente possível extrair e transformar as fibras de amianto crisotila em produto acabado em condições seguras para trabalhadores e população em geral’, salientou. fls.29 PROCESSO Nº TST-RR-92840-68.2007.5.02.0045 C/J PROC. Nº TST-AIRR-92841-53.2007.5.02.0045
Com mais de 26 anos de trabalho no segmento, ele falou em nome dos trabalhadores e afirmou que estes podem ser prejudicados se o amianto for substituído ou proibido. Adilson mostrou um vídeo expondo a realidade do uso do amianto no passado e no presente, asseverando que muitas das exposições feitas anteriormente não correspondem à realidade atual do Brasil. Segundo ele, atualmente, há umidificação das minas, as operações são monitoradas por vídeo, o processo é enclausurado (sem poeira) e o ensacamento automatizado. ‘Hoje, o trabalhador não põe a mão em fibra de amianto, tanto nas fábricas quanto nas minas’.
Adilson Santana disse que as ADIs contra a proibição do amianto nos estados foram ajuizadas pela Confederação Nacional dos Trabalhadores da Indústria (CNTI) a pedido dos trabalhadores do amianto crisotila, ‘legítimos representantes da categoria, composta por 15 fábricas de fibrocimento e mais a mineração’. Ele afirma que a defesa do amianto é apoiada pela maioria das centrais sindicais e por mais de 70 entidades nacionais. ‘O uso seguro e responsável do amianto crisotila no Brasil é uma realidade e uma conquista dos trabalhadores, graças às comissões de fábrica que fiscalizam o processo para garantir que as regras de segurança sejam cumpridas’, disse.
O presidente da FITAC ressaltou o acordo assinado há mais de 23 anos para garantir a saúde e a segurança dos trabalhadores do Brasil, ‘diferente de outros países’, e que nele são contempladas mais de 60 cláusulas, como o limite de exposição, ‘que é 20 vezes menor’ que o previsto em lei. ‘Agora que conseguimos organizar nossos locais de trabalho, garantindo um ambiente seguro, querem jogar todas as nossas conquistas no lixo e substituir a crisotila por produtos sintéticos que as multinacionais estão impingindo’.
Adilson Santana reconhece que os problemas do passado não podem ser desprezados, e afirma que esse passivo é de responsabilidade dos patrões que expuseram os trabalhadores aos riscos elevados da época. Mas afirma que a realidade hoje é outra, e que as pesquisas mostram que as doenças são coisas do passado. ‘Nós, trabalhadores, não somos suicidas. Não podemos dar a vida para ganhar a vida, não somos irresponsáveis’, concluiu."
Hoje em dia, a despeito das opiniões favoráveis, o fato é que não se reconhece uma quantidade mínima de asbesto abaixo da qual fls.30 PROCESSO Nº TST-RR-92840-68.2007.5.02.0045 C/J PROC. Nº TST-AIRR-92841-53.2007.5.02.0045
a exposição possa considerar-se segura, como observou o Comitê Científico de Toxicidade, Ecotoxicidade e Ambiente, em parecer decisivo para a edição da Directiva nº 1.999/77/CE, no âmbito da União Europeia. Vale dizer, inexiste certeza de que as fibras microscópicas do amianto branco não se desprendam e, sem dissolver-se ou evaporar porque a sua natureza o impede, ingressem no pulmão por meio de uma simples aspiração em ambiente contaminado.
Em vez de se emprestar efetividade ao princípio da precaução – conduta preventiva para a qual devem concorrer o Estado e toda a coletividade (artigo 225, Constituição Federal), inclusive o segmento empresarial, converte-se o homem trabalhador em cobaia com morte precoce e anunciada.
É indene de quaisquer dúvidas o risco que o amianto representa para a saúde. Logo, os trabalhadores de empresas cujo ramo de atividade utiliza esse produto tóxico por natureza lidam com um risco imanente ao próprio trabalho.
Sérgio Cavalieri Filho diz que "quem se dispõe a exercer alguma atividade perigosa terá que fazê-lo com segurança, de modo a não causar dano a ninguém, sob pena de ter que por ele responder independentemente de culpa" (in Programa de responsabilidade civil. 5ª ed. ver., aum. e atual. De acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 148)
Mais se enfatiza essa noção com a teoria do risco-proveito, pois deve reparar o prejuízo aquele que obteve lucros ou proveito da atividade danosa.
A incidência do princípio da precaução – haja vista a ignorância ou incerteza acerca da causalidade – desafia os postulados ascéticos da economia e contempla a prevalência dos valores humanitários. A produção e a circulação de riqueza não devem ser obscurecidas na ponderação de valores que caberá à corte constitucional, parecendo truísmo dizer sobre os reflexos normalmente positivos que a atividade produtiva gera no bem-estar dos grupos humanos que nela se envolvem, ou dela se beneficiam materialmente. fls.31 PROCESSO Nº TST-RR-92840-68.2007.5.02.0045 C/J PROC. Nº TST-AIRR-92841-53.2007.5.02.0045
Se o dano ao meio ambiente, como poluição, impõe responsabilidade objetiva do autor do dano para todo o entorno habitado, seria teratológico pensar de forma diferente quando o dano acomete o próprio trabalhador que exerce sua atividade profissional naquele estabelecimento, mesmo diante da adoção de medidas preventivas (uso de EPIs) e do cumprimento dos parâmetros estabelecidos em lei (ainda em trâmite de ADI) para a utilização do amianto branco.
Como dito alhures, o de cujus foi acometido por mesotelioma, doença relacionada com a inalação de poeira de asbesto. Sobre isso define e esclarece René Mendes:
"Os mesoteliomas malignos (MM) afetam pleura, peritônio e pericárdio. Aparentemente, a ocorrência de mesotelioma de peritônio está relacionada a doses extremamente elevadas de exposição. É, praticamente, a única neoplasia que apresenta relação causal tão conspícua com um agente ocupacional ou ambiental, o asbesto, a ponto de se poderem fazer previsões extremamente precisas sobre sua ocorrência epidemiológica futura, com base apenas nos padrões de exposição ao asbesto nas diversas localidades (Robinson et al., 2005).
A incidência de MM varia de acordo com o uso do asbesto. Países que não utilizaram asbesto apresentam uma incidência de ‘fundo’ de um a dois casos por milhão de habitantes/ano, tanto em homens quanto em mulheres. (...) Atualmente, não se produzem nem se utilizam anfibólios comercialmente. A ocorrência de mesotelioma relaciona-se à exposição a fibras de anfibólios e crisotila, porém a potência dos anfibólios é superior à da crisotila (Hodgson, Darnton, 2000, Hammar, 2011b).’
(...) Na região de Campinas, SP, onde existe relativa concentração de empresas manipuladoras de fibrocimento e fabricantes de freios e discos de embreagem, foram descritos três casos de MM de pleura, tendo sido constatada exposição ocupacional em um deles, ocupacional indireta em outro, e domiciliar, a partir de asbesto trazido pelo pai, em um terceiro (De Capitani et al., 1997a). Dados sobre diagnósticos e óbitos por MM provêm de banco de dados de registros de base populacional INCA/MS e registros de mortalidade SIM/MS. Pedra et al. (2008) demonstraram uma tendência fls.32 PROCESSO Nº TST-RR-92840-68.2007.5.02.0045 C/J PROC. Nº TST-AIRR-92841-53.2007.5.02.0045
progressiva de óbitos por câncer de pleura e mesoteliomas, analisando dados do SIM/MS de 1980 a 2003. Na região Sudeste, dados de óbitos por mesoteliomas em adultos maiores de 20 anos mostram uma tendência crescente no Estado de São Paulo" (p. 1.265-1.266).
Releva notar aqui, que não se pretende, nem de longe, resolver esse tormentoso conflito de interesses sobre a segurança do processo do produto do amianto branco, pois será do Supremo Tribunal Federal a última palavra, a quem cabe por direito.
Contudo, no caso em apreço, está-se diante de uma doença caracterizada como ocupacional e relacionada diretamente ao ramo de atividade empresarial da reclamada, configurando indelevelmente o dano sujeito à reparação por quem o causou. Reparação essa que deve se revestir de caráter compensatório, punitivo e pedagógico envolvida na responsabilidade do ofensor.
Assim, no arbitramento da indenização correspondente, contudo, o julgador deve ter em mira as partes envolvidas na lide, o dano ocorrido e os seus efeitos. Compete, ainda, ao juiz, usando do livre arbítrio na fixação da indenização por dano moral, arbitrar quantia suficiente para minorar o sofrimento do ofendido, sem concorrer para o seu enriquecimento sem causa ou para o empobrecimento do ofensor.
O valor da indenização deve ser aferido, pois, mediante esses parâmetros balizadores e de acordo com a extensão do dano em cada caso, conforme o artigo 944 do Código Civil.
Pode-se dizer que a impossibilidade de retorno ao status quo ante em razão do evento morte ocasionado pela doença ambiental e ocupacional esvazia quase por completo a função compensatória da pena, não fosse, ante a inexorável irreversibilidade do dano, a transmissão da pretensão reparatória aos seus sucessores. A seu turno, o caráter punitivo já se encontra alcançado pela fixação da indenização que atinge a função de reprimenda. E, é, por fim na função pedagógica da sanção, quando se busca desestimular a conduta danosa praticada pelo ofensor, que se deve deter especial atenção. fls.33 PROCESSO Nº TST-RR-92840-68.2007.5.02.0045 C/J PROC. Nº TST-AIRR-92841-53.2007.5.02.0045
Na questão da qual ora se trata, doença pulmonar pela inalação de poeira tóxica provocada em função do ramo de atividade da reclamada, não há como se furtar ao interesse da humanidade, aí considerado em sua essência o cidadão, como tal e na qualidade de trabalhador, na prevenção e desestímulo da conduta danosa verificada.
Nesse aspecto, reverbera a lição de Antônio Joaquim de Matos Pinto Monteiro, a saber:
"Efetivamente, uma das razões (senão a principal) porque a pena privada e, bem assim, os meios de coerção ao cumprimento vêm despertando um interesse crescente (...) é o da relativa ineficácia, sob o ponto de vista preventivo sancionatório, da tutela operada por via da indemnização. Sendo esta um mecanismo destinado à reparação de danos, cuja determinante é, pois, o ressarcimento do lesado, a pena privada surgiria, em contraste, como medida cuja ratio é a imposição ao lesante de uma quantia superior ao prejuízo por si causado, em que as finalidades preventiva e de repressão ocupam o lugar central e decisivo. O que, por vezes, se mostra especialmente útil ou necessário, pois a pena privada revelar-se-á 'o único instrumento verdadeiramente eficaz quando o potencial autor do dano não encontre na obrigação de indemnizar uma razão bastante para se abster do seu comportamento, uma vez que a medida da indemnização, estando balizada pelo limite do dano, é inferior ao proveito (que ele retira) da sua própria iniciativa’ (ENRICO MOSCATI, Pena [Diritto Privato], cit., p. 781). Recorde-se, aliás, que o problema da faute lucrative, rectius, do enriquecimento do lesante (a que a obrigação de indemnizar não dá resposta (...), constitui uma das situações em que tanto a jurisprudência inglesa como a sua congênere norte-americana se mostram particularmente sensíveis à concessão de punitive damages (...). Trata-se, pois, numa palavra, com o apelo á pena privada, de permitir ao lesado obter uma quantia superior à que arrecadaria através da indemnização, a qual se destina, mais do que a repara-lo, a atuar sobre o lesante, em ordem a prevenir atuações ilícitas futuras. (in Cláusula penal e indenização. Coimbra: Almedina, 1990, pp. 659-663.) fls.34 PROCESSO Nº TST-RR-92840-68.2007.5.02.0045 C/J PROC. Nº TST-AIRR-92841-53.2007.5.02.0045
Nesse contexto e, diante de tudo quanto foi acima exposto, é no mínimo intrigante a nota de esclarecimento constante do sítio da reclamada a respeito da segurança do processo de mineração e fabricação de produtos com amianto crisotila e da política de acordos para manutenção de plano de saúde com antigos profissionais, além da (proposital?) falta de menção sobre os casos de doenças diagnosticados, mas, ao reverso, a informação de não reconhecimento de doenças relacionadas ao asbesto sobrepuja facilmente (http://www.eternit.com.br/destaques/institucionais/esclarecimento-sobre-reportagem-veiculada-no-jornal-el-pais; e http://www.eternit.com.br/sobre-a-eternit/crisotila. Acesso em 27/2/2014, 14h16).
Faz-se necessário aqui ponderar que a efetiva constatação do mesotelioma no antigo colaborador sobreleva qualquer alegação de adoção de medidas preventivas, como uso de EPIs, e de observância dos limites da lei, segundo o modelo exegético de conveniências para o processo do produto de amianto. A contraposto, apenas corrobora o fato de ser uma ameaça a saúde dos trabalhadores, quiçá de todo os arredores da fábrica, pois as medidas adotadas não foram capazes de elidir a referida doença letal.
Por fim, não é demais acrescentar as palavras do Ministro Cláudio Mascarenhas Brandão acerca da proteção à saúde do trabalhador e sua efetiva preservação, in verbis:
"Numa sociedade em transformação, marcada pela multiplicidade das relações sociais e pelo seu caráter mutável, num ambiente de rápidos avanços proporcionados pela tecnologia, tornando obsoleto amanhã o que hoje é novidade, não se pode pretender que seja possível ao legislador traçar toda a sua regulamentação por meio de normas caracterizadas pelo conteúdo preciso e definido, albergando valores que por elas são influenciados e também as influenciam.
No campo específico da proteção à saúde, foco principal do presente estudo, a cada dia são inseridas no processo de produção novas matérias-primas, tecnologias e modificados os processos de fabricação, fls.35 PROCESSO Nº TST-RR-92840-68.2007.5.02.0045 C/J PROC. Nº TST-AIRR-92841-53.2007.5.02.0045
criando um ambiente propício para a inserção das cláusulas gerais no sistema jurídico, a fim de tornar possível a sua preservação efetiva, razão pela qual agiu acertadamente o legislador quando previu de forma genérica a regra da reparação.
Remete, também de forma correta, à jurisprudência a tarefa de definir os seus limites e contornos, o que não se fará de forma livre, mas segundo os valores adotados no sistema jurídico, dentre os quais sobreleva destacar a dignidade da pessoa humana, o valor social do trabalho, a proteção ao meio ambiente do trabalho, a redução dos riscos do trabalho e o direito à plena reparação dos danos ocasionados à pessoa do empregado." (in Acidente do Trabalho e Responsabilidade Civil do Empregador. 3. ed. São Paulo: LTr, 2009, p. 238.)
Todas essas considerações acabam por demonstrar, a meu sentir, cabal violação do artigo 5º, V, da Constituição Federal, pois não observada, na fixação do valor da indenização, a proporcionalidade imanente ao dano causado, e que afeta à vida, ao meio ambiente de trabalho, à dignidade da pessoa humana em sua compreensão kantiana (o homem é fim, não meio) e por derradeiro, mas não menos relevante, ao direito fundamental à saúde, que não comporta espaços de imunização equivalentes aos ambientes de trabalho e os valores sociais do trabalho.
Portanto, dou provimento ao agravo de instrumento para, destrancado o recurso, determinar que seja submetido a julgamento na primeira sessão subsequente à publicação da certidão de julgamento do presente agravo, reautuando-o como recurso de revista, observando-se daí em diante o procedimento relativo a este.
II - RECURSO DE REVISTA
O recurso é tempestivo (fls. 773, 905 - doc. seq. 1), subscrito por procuradora regularmente constituída nos autos (fls. 87 e 89 - doc. seq. 1), e dispensado o preparo. fls.36 PROCESSO Nº TST-RR-92840-68.2007.5.02.0045 C/J PROC. Nº TST-AIRR-92841-53.2007.5.02.0045
1 - PRELIMINAR DE NULIDADE DO ACÓRDÃO REGIONAL POR NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL
Conhecimento
Deixo de apreciar a preliminar em questão, com fulcro no artigo 249, § 2º, do CPC.
Prejudicado.
2 – DANO MORAL. CONTATO COM ASBESTO. DOENÇA OCUPACIONAL. MESOTELIOMA. MORTE DA VÍTIMA. QUANTUM INDENIZATÓRIO
Conhecimento
Nos termos da argumentação expendida no voto do agravo de instrumento, foi configurada afronta ao artigo 5º, V, da Constituição da República.
Conheço do recurso de revista.
Mérito
Conhecido o recurso de revista por ofensa ao artigo 5º, V, da Constituição da República, o seu provimento é consectário lógico.
In casu, entendo que, no arbitramento do valor estimado para o dano moral em casos tais, deve-se considerar a gravidade do fato e os evidentes danos à integridade física e psicológica do trabalhador, o qual veio a falecer. Também interfere a atribuição de responsabilidade da empresa por fomentar atividade de risco e desta tirar proveito com receita líquida de resultado crescente. Valho-me per relationem dos fundamentos que motivaram o provimento do agravo de instrumento que destrancou o presente recurso de revista. Considerando-se, ainda, a função pedagógica da sanção, com vistas à prevenção e ao desestímulo da conduta danosa, que atenta contra valores fls.37 PROCESSO Nº TST-RR-92840-68.2007.5.02.0045 C/J PROC. Nº TST-AIRR-92841-53.2007.5.02.0045
humanitários e constitucionais da mais alta estatura jurídica, elevo a R$ 1.000.000,00 o valor de tal indenização por danos morais.
Assim, dou provimento ao recurso de revista, para aumentar o quantum reconhecido para o dano moral em R$ 1.000.000,00, valor da indenização correspondente, na forma do pedido. Julgado prejudicado o exame da preliminar de nulidade por negativa de prestação jurisdicional.
ISTO POSTO
ACORDAM os Ministros da Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade: a) dar provimento ao agravo de instrumento para, destrancando o recurso, determinar que seja submetido a julgamento na primeira sessão subsequente à publicação da certidão de julgamento do presente agravo, reautuando-o como recurso de revista, observando-se daí em diante o procedimento relativo a este; b) deixar de examinar a preliminar de nulidade, com fulcro no art. 249, § 2º, do CPC; e c) conhecer do recurso de revista, por violação do artigo 5º, V, da Constituição Federal, e, no mérito, dar-lhe provimento para elevar o quantum reconhecido para o dano moral a R$ 1.000.000,00, valor da indenização correspondente, na forma do pedido. Custas majoradas para R$ 20.000,00.
Brasília, de de
AUGUSTO CÉSAR LEITE DE CARVALHO
Ministro Relator
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